Conheci Sergio
Alves , lá pelos idos dos anos 80 no Rio de Janeiro, tempos de poesia
urbana, poesia de rua, com Samaral, Douglas Carrara, Edu
Planchês, Lucio Celso Pinheiro, Iverson Carneiro, Flávio
Nascimento, Zé Cordeiro, Moacy Cirne, Brasil Barreto, Paco
Cac e Marko Andrade. Para
encontrá-lo bastava ir ao Passa na Praça
Que A Poesia Te Abraça. Varal de Poesia Ao Sabor do Vento. Feira de
Poesia Na Cinelândia. Voltei a encontrá-lo pessoalmente
na edição do POLEM comandado por Marcelo Mourão, na Taberna de Laura em
Copabana, outubro de 2019, edição em
homenagem a poesia urbana carioca dos anos 80.
SERGIO ALVES - Escritor,
jornalista, animador cultural, ator, diretor de teatro, compositor. É autor de
6 livros de poesia. Militante do movimento cultural e do movimento negro há
mais de 40 anos. Com 15 anos ingressou no grêmio estudantil, atuando como
diretor cultural. Participou da histórica Feira
da Poesia da Cinelândia, no começo dos anos 80.
Em 1984 foi um dos
fundadores do grupo Poça D’Água e do
projeto “Passa na Praça que a Poesia te
abraça”. Em 1990, participou da
fundação do MACACO – Movimento de Arte e Cultura Alternativa, Comunitária e
Organizada. Em 1991, teve seu poema “Cidade
Dormitório”, usado como tema de prova do vestibular da Cesgranrio. Em 1992, conquistou o 2º lugar, com o Poema “Mente Sã”, no Prêmio Internacional Cataratas, da prefeitura de Foz de
Iguaçu.
Em teatro, Em 2004, dirigiu
as peças “A Conta e o Tempo” de Regina Pierini e “Espíritos, Amor de Outras Vidas” de Vagner Castellanos. Em
2014, participou da criação , junto com a Banda DSD, o projeto “O Poeta e o Cantador”. Em 2015,
participou da fundação do Coletivo Cultural “Rio da Prata”. Em 26 de
junho de 2018, recebeu o Diploma Heloneida
Studart, da Comissão de Cultura da ALERJ. É membro da diretoria do CEDICUN
– centro de Estudos e Divulgação das Culturas Negras.
Artur
Gomes- Como se processa o seu estado de poesia?
Sergio
Alves - Depende muito do momento. Surge a ideia, corro e anoto.
Depois vou trabalhando essa ideia, trabalhando as palavras, buscando a poesia.
Artur
Gomes - Seu poema preferido? Próprio. Ou de outro poeta de sua
admiração.
Sergio
Alves - São muitos. Alguns fazem parte do meu repertório, sempre
declamo ou trabalho com meus alunos, como por exemplo “Versos Íntimos”, de Augusto dos Anjos, que foi o primeiro poema
que ouvi alguém declamar, um professor de literatura que o declamou em sala de
aula quando eu tinha 15 anos. Outro que adoro é “O Analfabeto Político”
de Berthold Brecht ou “A Flauta
Vértebra” de Maiakoviski. Dos brasileiros, adoro “O Operário em Construção”,
do Vinícius de Moraes, “Os Estatutos do
Homem”, do Thiago de Mello, dentre muitos outros.
Dos meus, gosto muito do “Poema Fúnebre”, tem também “Mente Sã”, “Soweto, Salvador , Rio” que são os mais conhecidos, além do “Cidade Dormitório”, que foi matéria de Vestibular, em 94.
Artur
Gomes - Qual o seu poeta de cabeceira?
Sergio
Alves - São muitos. Não tenho como especificar nenhum. Leio
vários ao mesmo tempo. Com essa pandemia então, estou um verdadeiro leitor
maluco, lendo desde Gregório de Mattos, Castro Alves, Lorca e Cervantes até os
contemporâneos. Estou revisitando os companheiros poetas atuais do movimento
marginal e alternativo, como o Flávio
Nascimento, Cairo Trindade, Iverson Carneiro, Marcelo Mourão, Zé Cordeiro,
João Batista Alves, Douglas Carrara... Muita gente. Estou
um verdadeiro rato da minha própria biblioteca.
Artur
Gomes - Em seu instante de criação existe alguma pedra de toque,
algo que o impulsione para escrever?
Sergio
Alves - Sim. A temática social. A luta de classes me fascina. A
luta do homem por liberdade, contra a opressão me impulsiona. A luta contra a
escravidão, em todos os tempos, são meus temas prediletos.
Artur
Gomes- Livro que considera definitivo em sua obra?
Sergio
Alves - Já publiquei seis livros. Participei de muitas
antologias. Mas acho que nenhum é definitivo. Porque sempre estamos aprendendo,
trocando com outros artistas.
Artur
Gomes - Além da poesia em verso já exercitou ou exercita outra
forma de linguagem com poesia?
Sergio
Alves - Escrevo desde os 12 anos, mas comecei minha atuação cultural aos 15
anos, em 1975, quando ingressei no grêmio estudantil. Depois ingressei num
grupo de teatro da escola e nunca mais parei. Era ditadura militar e os grêmios
eram proibidos. A militância era feita na clandestinidade. Havia vários
cineclubes atuando e apresentávamos vários esquetes e pequenas peças. Portanto,
costumo dizer que o teatro popular
entrou antes da poesia em minha vida.
Comecei mesmo a levar a poesia
a sério em 1984, quando conheci o João
Batista, o Zé Cordeiro, o Douglas, o Misael, a Rosinha na
Feira da Poesia da Cinelândia e fundamos o “Passa
na Praça que a Poesia te Abraça”.
Artur
Gomes - Qual poema escreveu quando teve uma pedra no meio do
caminho?
Sergio
Alves - Como eu disse, são quase 40 anos de atividades culturais.
Como negro, morador da Zona Oeste, educador, de família pobre, sempre tive
pedras no meio do caminho. Cada poema que escrevo é uma forma de enfrentar e
denunciar essas pedras.
Artur
Gomes - Revisitando Quintana: você acha que depois dessa crise
virótica pandêmica, quem passará e quem passarinho?
Sergio
Alves - Tenho certeza que o fascismo, implantado recentemente em
nosso país, passará, como passou o nazismo, como passaram os tiranos que a
história nos mostra. Mas para que essa tirania desapareça de vez em nosso país,
é preciso muito investimento em educação e em cultura. Só assim o povo consegue
identificar e não votar nos lobos disfarçados em pele de cordeiro e seus
lacaios, que são cordeiros querendo vestir a pele de lobo. Esses são os piores.
Artur
Gomes - Escrevendo sobre o livro Pátria A(r)mada, o poeta e
jornalista Ademir Assunção, afirma que cada poeta tem a sua tribo, de onde ele
traz as suas referências. Você de onde vem, qual é a sua tribo?
Sergio
Alves - Minha tribo vem da África. Meus ancestrais, minhas
referências vem desde o primeiro negão que fugiu pro quilombo. Com esse pensamento,
continuo por aqui, fundando quilombos
por onde passo. Nunca sozinho, sempre de mãos dadas com companheiros,
fortalecendo coletivos. Aqui na Zona Oeste, fundamos o MACACO e o Coletivo Cultural
Rio da Prata, ingressei no CEDICUM –
Centro de Estudos e Divulgação das
Culturas Negras, que é uma das maiores referências do movimento negro da
região e está completando 32 anos.
Outra tribo que adoro são os jovens, com quem
trabalho diariamente como animador cultural e educador social. Adoro
experimentar novas linguagens e com esse espírito criei, junto com o pessoal da
Banda DSD o projeto “O Poeta e o Cantador”, um encontro com a vanguarda jovem da região. Essa é a
minha tribo.
Artur
Gomes - Nos dias atuais o que é ser um poeta, militante de
poesia?
Sergio
Alves - Sou um cidadão de esquerda, filiado ao Partido dos Trabalhadores desde 1990.
Mas procuro não partidarizar a minha poesia, a minha arte. Me defino mais como
militante do movimento social, do movimento cultural, do movimento negro. Acho
que muitos grandes escritores conseguiram esse feito, como Jorge Amado, Graciliano
Ramos, entre outros. Só não acredito na chamada “arte pela arte”, essa, na minha opinião, não conscientiza, não
desperta ninguém.
Artur
Gomes - Que pergunta não fiz que você gostaria de responder?
Sergio
Alves - Sobre a obrigação do poder público de fomentar a cultura.
Respondo que deveria ser
prioridade. Como educador e animador cultural, trabalhei em muitos projetos nas
comunidades e em escolas. Posso afirmar que esses projetos salvam vidas,
retiram jovens dos braços do crime; já aconteceu com alunos meus. Acho que cada escola deveria ter um escritor
de plantão, violões e berimbaus à disposição. Só acredito no governante que ao
invés de fazer gestos com armas nas campanhas, jogue capoeira e dance um jongo
com os meninos nas comunidades.
A poesia agradece.
FulinaímaMultiProjetos
portalfulinaima@gmail.com
(22)99815-1268 - whatsapp
Sérgio, meu querido irmãozinho e amigo do peito, li sua entrevista, achei maravilhosa, com ótimas respostas. Para meu orgulho e alegria, eu já conhecia bem a fundo sua história, mas ainda consegui aprender um pouquinho mais. Muito agradecido por me citar como um de seus poetas contemporâneos preferidos. Eu fiquei muito feliz. Obrigado sempre! Uma abração carinhoso!
ResponderExcluirMarcelo Mourão
Ótima, entrevista. Conheci e relembrei um pouco da sua história de luta. Parabéns!!
ResponderExcluirGrande Sergio Alves! Um batalhador, desde sempre, pela poesia e pela igualdade social, nesse país tão maltratado. Entrevista forte, real, corajosa e poética. Parabéns, meu mano.
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