Nosso contato no face surgiu depois que o conheci ao vivo no
Gente de Palavra Paulistano, na
Patuscada, comandado por outros dois grande amigos e grandes poetas, Cesar Augusto de Carvalho e Rubens Jardim, fevereiro de 2019, em
homenagem a outra grande amiga e também grande poeta Dalila Teles Veras.
Juro, que quando vi o Daniel,
pensei estar novamente diante de Paulo
Brusky, poeta e amigo que vi pela última vez em 1987 na cidade de
Batatais-SP. A noite foi um vendaval poético, 29 poetas fazendo leituras da poesia
de Dalila, numa sinfonia de vozes emocionadas
com a grandeza do que estava sendo dito.
Daquela noite em diante, Daniel Perroni Ratto faz parte do meu
roll de amigos de face, que com sua brava poesia enriquece ainda mais essa
nossa Balbúrdia Poética.
Daniel
Perroni Ratto - Vencedor
do Prêmio Guarulhos de Literatura 2019, na categoria, Escritor do Ano, com o
livro, Alucinação (Algaroba, 2018), Daniel Perroni Ratto é poeta, jornalista,
músico e editor, pós-graduado em Mídia, Informação e Cultura pela ECA/USP. É
autor dos livros, Urbanas Poesias (Ed. Fiúza, 2000), Marte mora em São Paulo (A
Girafa, 2012), Marmotas, amores e dois drinks flamejantes (Ed. Patuá, 2014) e
VoZmecê (Ed. Patuá, 2016).
Foi cronista do UOL Música, editoria de música do portal Culture-se e do jornal Diário do Nordeste. Faz parcerias de composição com artistas da cena musical brasileira como: Tatá Aeroplano, Douglas Mam, Bleck a Bamba, Daniel Medina, Juli Manzi, etc.
Foi cronista do UOL Música, editoria de música do portal Culture-se e do jornal Diário do Nordeste. Faz parcerias de composição com artistas da cena musical brasileira como: Tatá Aeroplano, Douglas Mam, Bleck a Bamba, Daniel Medina, Juli Manzi, etc.
Artur
Gomes - Como se processa o
seu estado de poesia?
Daniel
Perroni - Boa noite, Artur. Agradeço o convite para participar
desse espaço bem bacana da literatura brasileira contemporânea.
Para mim, o “estado
de poesia” é uma ligação com o etéreo, das coisas universais e intangíveis
ao mesmo tempo em que está intimamente ligado ao mundano, aos fatos cotidianos
da urbanidade ou da natureza, do mundo tangível ao nosso redor. A chave,
talvez, seja uma sensibilidade para captar a energia que a matéria emana e das
luzes imateriais que viajam através das dimensões.
Artur
Gomes - Seu poema preferido? Próprio. Ou de outro poeta de sua
admiração.
Daniel
Perroni - Não tenho um poema próprio preferido. Claro, tenho poemas
que gosto menos, todavia, não tenho um de que goste mais. Vou pensar aqui. Bom,
tenho um carinho pelo poema “Marte mora em São Paulo”, por ter sido um
momento de ruptura, de uma nova práxis que se apresentava na minha vida,
naquele momento. Escrevi de uma tacada só, daquele jeito que Blake diz que tem que ser, logo após
minha primeira caminhada pela Avenida Paulista, pleno meio-dia. Sempre vivi na
praia, Fortaleza ou São Vicente. Só conheci a famosa selva de pedra, de fato,
jovem adulto, em 1998, aos 22 anos, quando escrevi o poema.
Marte
mora em São Paulo
Tudo o que pude fazer para você
deu no que deu
Comi o papel para o quê?
Tudo que ganhou foi meu.
deu no que deu
Comi o papel para o quê?
Tudo que ganhou foi meu.
Radioatividade de pessoas
Cantam na Paulista com Augusta
Ruas glamourosas e coroas
na vida ganha da grana sua.
Aliens atropelam corações
que tentam ser São no salmo
Homens caçam perdões
Marte mora em São Paulo.
Violência sensorial extrapola
Guerra Mundial Nuclear
Meu tesão controla
Brindes nas Ondas… No Mar.
No Mar Edificado das capitais
Perdido no concreto armado
Enjaulado como animais
Em São Paulo Campo minado.
Perdido no concreto armado
Enjaulado como animais
Em São Paulo Campo minado.
Planos confabulados
por metro quadrado
Alienígenas de várias
Alienígenas de várias
Métrica totalmente aleatória Desagrado
Raios inversos na térmica da Atmosfera.
Amanhece com o frio usando no edredom
Meio-dia de mangas curtas e suor escorre
Balas psicodélicas perseguem o Poseidon
Sujeito seguido
dentro do software
corre ou morre
A mulher fatal estende a mão para o alto
Lá de cima o homem olha os terráqueos
Quadro enfocado dos sacos esfaqueados
Só eu sei que Marte Mora em São Paulo
Comunicação telepática além dos óculos
Escuros espaços nas calçadas do Universo
ali do lado perto das famosas esposas do
povo
Escuros espaços nas calçadas do Universo
ali do lado perto das famosas esposas do
povo
O gigolô fuma um cigarro
e puxa a camisa de Vênus
Carros correm nas avenidas
com a pressa do tempo
Aviões monitorados nos
Aviões monitorados nos
micros trazem pessoas
Helicópteros transportam
executivos e canais de TV
Motos desafiam a gravidade
e levam a Morte na garupa
Motos desafiam a gravidade
e levam a Morte na garupa
Ninguém se entende
nesse caos proposital
minhas rimas seguem
minhas rimas seguem
qualquer padrão
E fica assim então como
divergência intelectual
das diversas formas de vida
das diversas formas de vida
que vivem no hospedeiro
corpo humano veículo ineficaz
de supremacia
corpo humano veículo ineficaz
de supremacia
A praga já se disseminou
e contagiou as mentes
os mendigos vivem
os mendigos vivem
nas ruas sem dentes
e não tem como
e não tem como
resolver a problemática
sem vacina
sem vacina
Marte Mora em São Paulo.
Marcianos exploram
o governo Mundial
Manipulação das
criaturas noturnas
Saturno vive em São Paulo
Saturno vive em São Paulo
Saturnianos enfrentam
Marcianos pela posse
guerra sanguinolenta
guerra sanguinolenta
entre espécies
Manipulação das criaturas
subterrâneas
Andrômeda assalta São Paulo
Andrômeda assalta São Paulo
Andromedanos
disputam com
Plutanianos
o direito de roubar
energia dos nordestinos
que vieram de Mercúrio
que vieram de Mercúrio
onde o vermelho não possibilitava
temperaturas satisfatórias
Os povos da
Constelação de Órion
encontraram moradia
encontraram moradia
na zona Leste
Os Orionmanos
se organizam nos guetos
armamento pesado
armamento pesado
pra combater
os alienígenas de Júpiter
guerreiros gigantes
os alienígenas de Júpiter
guerreiros gigantes
que se infiltraram
em todos os lugares do mundo
globalizando informações
globalizando informações
para poderem dominar
Ali e Acolá
no meio das ruas
a guerra está aberta
O Ser Humano
a guerra está aberta
O Ser Humano
e não voltar
ou de ficar
e não deixar
e não deixar
prospera nas leis
estabelecidas pelos Marcianos
Vou ficando como um louco
que não reconhece
as digitais da sua companheira
um fato pode ser esclarecido
o planeta Marte mora em São Paulo.
que não reconhece
as digitais da sua companheira
um fato pode ser esclarecido
o planeta Marte mora em São Paulo.
Tem esse texto visceral de Torquato
Neto que levo sempre comigo:
“Escute, meu chapa: um poeta não se faz com versos. É o risco, é
estar sempre a perigo sem medo, é inventar o perigo e estar sempre recriando
dificuldades pelo menos maiores, é destruir a linguagem e explodir com ela.
Nada no bolso e nas mãos. Sabendo: perigoso, divino, maravilho. Poetar é
simples, como dois e dois são quatro, sei que a vida vale a pena etc. Difícil é
não correr com os versos debaixo do braço. Difícil é não cortar o cabelo quando
a barra pesa. Difícil, para quem não é poeta, é não trair a sua poesia, que,
pensando bem, não é nada, se você está sempre pronto a temer tudo; menos o
ridículo de declamar versinhos sorridentes. E sair por aí, ainda por cima
sorridente mestre de cerimônias, “herdeiro”
da poesia dos que levaram a coisa até o fim e continuam levando, graças a Deus.
E Fique sabendo: quem não arrisca não pode berrar. Citação: leve um homem e um
boi ao matadouro. O que berrar mais na hora do perigo é o homem, nem que seja o
boi. Adeusão.”
Artur
Gomes - Qual o seu poeta de cabeceira?
Daniel
Perroni - Tenho lido muitos poetas contemporâneos, mas de cabeceira
posso dizer: Blake, Rimbaud, Burroughs, Piva,
João Cabral, Manoel de Barros, Waly e Torquato.
Artur
Gomes - Em seu instante de criação existe alguma pedra de toque,
algo que o impulsione para escrever?
Daniel
Perroni - Pode ser qualquer coisa que me desperte algum tipo de
sentimento, de emoção. Boa ou má. Não tenho nenhum tipo de ritual a me prender.
Artur
Gomes - Livro que
considera definitivo em sua obra?
Daniel
Perroni - Todos são definitivos, penso. Marcam as fases, as
transições de vida. Por óbvio, talvez o primeiro, Urbanas Poesias, lançado no ano 2000. Justamente por quebrar aquela
barreira de lançar ou não. De mostrar para as pessoas ou não. De dar a cara
para bater, de entender que ninguém é unanimidade e de lidar com a possível
rejeição, por certa parte dos leitores, com tranquilidade.
Artur
Gomes - Além da poesia em verso
já exercitou ou exercita outra forma de linguagem com poesia?
Daniel Perroni - A poesia está no mundo e a arte é seu
veículo na transmissão. De minha parte, além da poesia “de livro”, faço declamações, leituras, poesia audiovisual e
parcerias musicais.
Artur
Gomes - Qual poema escreveu quando teve uma pedra no meio do
caminho?
Daniel
Perroni - Vários, bicho. Até um “Poema Comunista” com a
forma, métrica e rima do “Poema da
Necessidade”, de Drummond, quando eu tinha uns 16 anos. Esse último livro, Alucinação (Algaroba, 2018), é,
basicamente, sobre a pedra fascista que está no caminho do Brasil, chamada
Bolsonaro.
Artur
Gomes - Revisitando Quintana: você acha que depois dessa crise
virótica pandêmica, quem passará e quem passarinho?
Daniel
Perroni - É um mundo novo, para além de Huxley, nada admirável. Já
vivemos nessas distopias que líamos em 1984 e Fahrenheit 451, por exemplo. Não é possível termos esse governo
simultaneamente ao coronavírus. É preciso extirpar o protozoário que ocupa o
Palácio da Alvorada. Acredito que ele e seus filhos, os Irmãos Metralha,
passarão. Os poetas, passarinho.
Artur
Gomes - Escrevendo sobre o livro Pátria A(r)mada, o poeta e
jornalista Ademir Assunção, afirma que cada poeta tem a sua tribo, de onde ele
traz as suas referências. Você de onde vem, qual é a sua tribo?
Daniel
Perroni - Sim, a tribo no sentido de serem suas experiências,
influências, que podem ser uma fusão da passagem por diversas tribos ao longo
da vida. Pelo menos, penso assim. Não me atenho a regras, formas, ritos. Nesse
caminho, sou anarquista. Venho do Ceará, com uma infância rica em artes, música
e poesia. Venho de São Vicente, com uma adolescência rica em esportes, contato
com a natureza, o mar, principalmente. Venho de São Paulo, das urbanidades do
ser cosmopolita. Venho de outras dimensões, das camadas mais finas, das
membranas intergalácticas da Teoria das
Cordas. Venho do sertão, do cangaço, da flor do mandacaru. Venho da vontade
de existir contida no Big Ben.
Artur
Gomes - Nos dias atuais o que é ser um poeta, militante de
poesia?
Daniel
Perroni - Poeta sempre foi, é, e será um revolucionário. Um
provocador do status quo. Um poema de Patativa
do Assaré, das agruras da seca é revolucionário. Onde canta o sabiá é
subversivo. O ato de fazer lembrar que
somos, que existimos, e, que, ao nosso redor está o que é, o que existe
para além do ego, do superego.
A poesia é a alma do mundo e o poeta a transporta até as
palavras.
Artur
Gomes - Que pergunta não fiz que você gostaria de responder?
Daniel
Perroni - Estou bem
satisfeito com a entrevista e feliz por tê-la respondido! Obrigado mais uma
vez, pelo espaço! Um grande abraço, Artur!
Fulinaíma
MultiProjetos
portalfulinaima@gmail.com
(22)99815-1268 - whatsapp
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