sexta-feira, 25 de setembro de 2020

Dinovaldo Gilioli - EntreVista

 

Intervenção poética 
no Museu de Londrina/PR.

Conheci Dinovaldo Gilioli lá pelo idos dos anos de 1980, fez parte de um seleto  grupo de amigos poetas, que de alguma forma foram os responsáveis pela difusão da Mostra Visual de Poesia Brasileira, entre eles: Uilcon Pereira, Hygia Calmon Ferreira, Gabriel de La Puente, Ronaldo Werneck, Joaquim Branco, Cesar Augusto Carvalho, Dalila Teles Veras, Luis Avelima, Celso de Alencar, Hugo Pontes, Moacy Cirne, Aricy Curvello, Leila Miccolis, Ziul Zerip, Tanussi Cardoso, Ricardo Pereira Lima, Zhô Bertholini, Rubervam Du Nascimento  e Paulo Brusky. Hygia Ferreira o chamava carinhosamente de Dino.

Nosso meio de comunicação era os CORREIOS e a correspondência se dava além das cartas, através de cartões postais, envelopoemas, arte posta e cadernos de poesia, muitos deles produzidos através de colagens impressas em xerox ou em serigrafia. Dino me leva a um momento emblemático da minha produção poética, que além da virada do olhar para a poesia social, foi um tempo em que todos nós poetas, naquele momento estávamos buscando outras plataformas para a divulgação de poesia, nossa ou de poetas mergulhados nos mesmos objetivos.  

 


Dinovaldo Gilioli, natural de Leópolis/PR, 1957, morou em Curitiba e reside atualmente em Florianópolis/SC. É formado em Ciências Contábeis, com especialização em Realidade Brasileira e pós graduação em Dinâmica dos Grupos. Na diretoria de cultura do Sindicato dos Eletricitários de Florianópolis – Sinergia e como ativista cultural coordenou concursos de conto e poesia promovidos pelo Sinergia, e várias atividades nas áreas de dança, teatro e música. 

Foi um dos vencedores do 5º concurso de poesia Helena Kolody no Paraná e de outros concursos literários em diversos estados, com a inclusão de seus poemas em mais de 20 antologias. Publicou sete livros: Fragmentos (edição do autor, 1982/85), Hálito de Água (Fundação Cultural de Curitiba,1989), Borboletas no Varal e Canção para Acordar Peixes (Editora Letras Contemporâneas, 1996/97), Sindicato e Cultura (Sinergia/Editora Insular, 2007), Cem poemas (Editora da UFSC, 2008) e Inventário de Auroras (Editora Costelas Felinas, 2018/19).

Possui artigos e crônicas em jornais e revistas do Brasil, principalmente alternativos. Foi editor da revista Pantanal, publicada pela Elase, divulgando trabalhos de poetas e contistas de todo país. Realizou com os artistas plásticos Carlos Alberto Schneider e Marcelo Pagliarim as exposições Arte e Poesia e O Silêncio Arde, respectivamente; expondo em Santa Catarina, Rio Grande do Sul e no Paraná.

 Artur   Gomes  -  Como se processa o seu estado de poesia?

Dinovaldo Gilioli - Escrevo muito pela observação ao meu redor, o que acontece no mundo é matéria para o poema. Meu estado de poesia também se exacerba das leituras, da prática da escrita, do exercício permanente, do aprendizado constante ao beber das mais variadas fontes.

Artur   Gomes  -  Seu   poema preferido?

Próprio. Ou de outro poeta de sua admiração.

 Dinovaldo Gilioli  - Tenho vários preferidos, mas ficarei num só pra não alongar.

 RAIZ

 cansei de flores e caules

         folhas e galhos

         frutas e cascas

              - eu quis -

 

                  agora

                  quero

                    raiz

                   (e ad

                jacências)

 o sumo da seiva da essência

 Eduardo Sterzi (do livro "na virada do século", organização de Claudio Daniel e Frederico Barbosa, Landy Editora, 2002.

Artur   Gomes  - Qual o seu poeta de cabeceira?

Dinovaldo Gilioli  - Não tenho poeta de cabeceira, têm poemas que dá vontade de ficar com eles na casa inteira e andar por aí a tiracolo.

 XII

 Te quero aberta florindo

Rindo todos os risos

Chorando todas as mágoas,

Te quero em azul e malva,

Corrente de areia e água

Te quero assim,

Vinda num manto liso

Nascendo de todos os risos

Morrendo dentro de mim.

 

Leila Echaime

 

 Poema

 Toda a carne

eu te dedico.

 

A do corpo

a que como.

 

Todas dedico

meu amor

à tua fome.

 

Renata Pallottini

 

 Ofício

 Que o poema

fale por si.

 

Que os poemas

deem a si mesmos

algum significado.

 

Que os poemas nos

deixem dormir

cada um prum lado.

 

Que os poemas nos

cobrem menos,

andamos tão atarefados.

 

Que não exijam demasiado,

que tenham em si a leveza

daquele dia em que eu sorria.

 

Por que poemas?

volta e meia me perguntam.

 

(Eu me faço essa pergunta todo dia).

 Marcelo Labes

 Artur  Gomes  -  Em seu  instante de criação existe alguma pedra de toque, algo que o impulsione para escrever?

Dinovaldo Gilioli - Não! Tudo ao meu redor ou distante, pode ser até uma faísca, é uma pista para o poema. Mantenho meu olhar atento na vida, em seus movimentos, em suas idas e vindas. O terreno fértil pode estar também nas leituras, na conversa mole, ou num papo sério ou até nos impropérios. Às vezes o poema vem cheio de mistérios, cheio de firulas; noutras se entrega por inteiro, feito um amor derradeiro. Escrever é uma forma de exorcizar silêncios!

Artur Gomes - Livro que considera definitivo em sua obra?


  - Dos meus, nenhum. De outros, bebo sempre. Uma obra que me toca é o "Livro dos Abraços", de Eduardo Galeano. No entanto, a palavra está posta a mesa, dela me sacio com a fome de um leitor curioso, de um escritor consciente que pouco sabe, que muito precisa aprender e estar desprendido do seu umbigo.

 Artur Gomes  - Além da poesia em verso já exercitou ou exercita outra forma de linguagem com poesia?

Dinovaldo Gilioli  - Dois projetos: Arte e poesia em movimento e O silêncio arde, com os artistas plásticos Carlos Alberto Schneider e Marcelo Pagliarim; respectivamente. Junção da arte plástica com a poesia num mesmo espaço. Essas exposições de quadros, instalações e objetos circularam por Santa Catarina, Paraná e Rio Grande do Sul. No RS, na cidade de Nova Prata, a exposição "arte e poesia..." participou da abertura de uma das edições do Congresso Brasileiro de Poesia, idealizado pelo jornalista e escritor Ademir Antonio Bacca.

Tenho alguns escritos que também podem ser considerados o que se convencionou chamar de prosa poética. Fiz (faço) intervenções com a poesia, como a "exposichão", numa das edições do Belô Poético, em Belo Horizonte/MG, organizado pelos escritores Rogério Salgado e Virgilene Araújo.

 Artur Gomes - Qual poema escreveu quando teve uma pedra no meio do caminho?

 Dinovaldo Gilioli  - Vários. O mais recente, foi quando o Brasil atingiu o vergonhoso marco de 100 mil mortes pela covid-19 (pandemia do coronavírus).

 

 Aos que ficam

 

o corpo está inerte

não se pode tocá-lo

 

um corpo que parte

parte os que ficam

 

sem um adeus de perto

sem um último olhar

sem um abraçar

 

vai o corpo levado

pelas mãos pesadas

da morte

 

fica entre nós

o melhor do corpo

aquilo que não acaba

 

fica o que tem sentido

o que encharca a vida

 

vai o corpo

        fica a alma

                na parede

                   da memória

 Artur   Gomes -  Revisitando Quintana: você acha que depois dessa crise virótica pandêmica, quem passará e quem passarinho?

Dinovaldo Gilioli  - Espero que passem todos os fascistas, os fundamentalistas, os cínicos moralistas, os fanáticos de todas as espécies. Que possamos vislumbrar uma luz, hoje esfumaçada por tanta mentira deslavada. Espero que passem os chamados "homens de bem", esses que não passam; isso sim, de bem hipócrita! Que passarinhe a democracia,  com justiça social e não só o direito de falar, de se expressar. O de ter comida pra comer, de ter casa pra morar, de ter terra pra plantar (não pra especular), de ter; enfim, vida digna pra todos e todas!

 Artur   Gomes  -   Escrevendo  sobre   o  livro Pátria A(r)mada, o poeta e jornalista Ademir Assunção, afirma que cada poeta tem a sua tribo, de onde ele traz as suas referências. Você de onde vem, qual é a sua tribo?

Dinovaldo Gilioli  - Não pertenço a nenhuma tribo, no que se refere a alguma escola literária, a algum estilo de escrita, algum grupo. Aliás, por falar em tribo, uma referência especial e, mais do que isso, gratidão a todos os indígenas, cuidadores e cuidadoras do planeta terra, da natureza. Claro que entendo a fala do Ademir Assunção.

Partimos de algum território, de algum lugar já caminhado. Por ele seguimos, desviamos, pegamos atalhos, refazemos, mas sem deixar de reconhecer o que aprendemos com os que passaram, com os que estão aqui.

Caramba são tantos, tantas referências e vou ficar só no Brasil; um celeiro de escritores e artistas de primeira: Manuel Bandeira, Oswald de Andrade, Paulo Leminski, Cruz e Sousa, Mário Quintana, Cecília Meireles, Clarice Lispector, Carlos Drummond de Andrade, José Paulo Paes, dentre outros.

Da safra contemporânea: Mano Melo, Tanussi Cardoso, Marceli Becker, Leila Míccolis, Marco Vasques, Alice Ruiz, Artur Gomes, Lindolf Bell, Astrid Cabral, Iacyr Anderson Freitas, Eliakin Rufino...

Artur Gomes  - Nos dias atuais o que é ser um poeta, militante de poesia?

Dinovaldo Gilioli - É não se deixar alienar, não se encapsular no ego, na soberba do título de escritor, poeta. É se posicionar sempre em defesa da vida, da liberdade. É se relacionar, partilhar a palavra poética. Se completar no outro, na outra, na perspectiva do nós, de desatar os nós que aprisionam os indivíduos. É exercitar a escrita na perspectiva do estímulo do senso crítico, da criatividade, do despertar para a sensibilidade. O ato de escrever deve contribuir para elevar a vida a sua condição mais humana. Que a vida criativa suplante o sufoco da vil sobrevivência, que preencha o oco do acúmulo de coisas imprestáveis para o anúncio da aurora.

Artur   Gomes  -  Que pergunta não fiz que você gostaria de responder?

 Dinovaldo Gilioli - Nenhuma. Agradeço a oportunidade e finalizo:

 

  escrevo com a

      palavra gasta

      e não gasto o

  gosto de escrever

 

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terça-feira, 22 de setembro de 2020

Tchello d´Barros EntreVista Artur Gomes

 


 Tchello d´Barros é um multi artista, poeta cineasta design gráfico,  amigo parceiro que conheci em 2003 em Bento Gonçalves numa das Edições do Congresso Brasileiro de Poesia. De lá prá cá, foram muitas as vezes em que estivemos juntos em alguma ação com Arte, entre elas as duas últimas edições da Mostra Internacional de Poesia Visual realizadas em Bento Gonçalves-RS com curadoria dele. Como as afinidades entre nós são múltiplas, formamos  uma santíssima trindade no Kino 3, que conta também com a participação de um outro parceiro,  Jiddu Saldanha.

Tchello d´Barros - Considerando-se que não existe um padrão entre autores para o processo criativo, poderia nos contar se você tem algum ritual ou procedimento para a criação de seus poemas?

 Artur Gomes – Planejado não, o ritual acontece naturalmente, pode ser depois de um vinho uma cerveja, um ato consumado, ou o olhar sobre coisas simples que para muitos possa parecer insignificantes. Mas ultimamente o processo criativo tem sido a tentativa de desconstrução diante desse estado pandemônico que estamos vivendo. Essa tragédia bárbara que estamos enfrentando que não é provocada apenas  por um vírus, mas também,  por todo descaso de um verme, que prometeu se eleito matar 30 mil, e hoje já matou 120 mil a mais que o prometido.

 Tchello d´Barros - Para além da poesia escrita e falada, você  é um artista multilinguagens (ou multimídia, como preferem alguns) que transita pela fotografia, o audiovisual, o teatro, a performance e a música. De que forma sua criação poética se situa nas outras linguagens artísticas?

Artur Gomes – Todas essas outras linguagens por onde transito tem a poesia como ponto de partida. Fui em busca de aprender a lidar com cada uma delas, para ampliar as possibilidades de uma maior divulgação da poesia, não tenho outro objetivo que não seja este. Hoje minha linguagem poética é essa uma fusão verso prosa ficção teatro povoada de imagens teatrais e cinematográficas, Teatro Cinema Fotografia Música, são paixões que me alimentam a escrever mais e mais.

 Tchello d´Barros - Artur Gomes é um poeta solar? Sim ou não e porquê? Defenda seu argumentos com alguns dísticos extraídos de seus poemas.

 Artur Gomes – Alguns de meus poemas posso dizer que são extremamente solares, mesmo quando escritos pelas madrugadas boêmias. Raramente escrevo algo sob o sol que eu vá aproveitar depois. Quase sempre é um rascunho, uma anotação, de idéias imagéticas, que surgem quando estou caminhando ou pedalando, pelo litoral de Chico City. a nova Sucupira do Itabapoana.  Se formos analisar os meus poemas, com relação ao tempo onde a ação contida neles ocorre, podemos dizer que são noturnos:

 A noite inteira

invento Joplin na fagulha

Jorrando Cocker na fornalha

 Mas a melhor resposta para essa pergunta, talvez esteja  na própria poética  do meu O Poeta Enquanto Coisa - Editora Penalux - 2020

Tchello d´Barros - Boa parte de sua produção poética aborda as questões sociais com forte tom crítico às questões políticas, o que nos lembra Maiakovski e tantos outros. Na contemporaneidade, a poesia engajada ainda tem força para conscientizar e levar as pessoas à ação?

Artur Gomes – Procuro não levar essa conscientização como fato principal na poesia, visto que naturalmente ela já é impactante enquanto linguagem. Eu acredito que qualquer poeta com um pouco de vivência, não tem como fugir dessas questões sócio políticas que enfrentamos, Muitas vezes, para lidar com isso, de uma forma makis irônica escrevo poemas eróticos, desbravados, sarcásticos, como forma de ironizar   esse falso moralismo dessa horrorosa família cristã brasileira. 

 Tchello d´Barros - A mulher é um tema recorrente em sua obra e por conseguinte, a temática universal da relação amorosa. Com as recentes emancipações da mulher na sociedade e respectivos empoderamentos do feminino, o que mudou em suas musas do início da carreira para as da atualidade?



 Artur Gomes – Acredito que a grande mudança se deu, na maturidade da escrita, a renovação constante da linguagem. As musas continuam sendo o que a terra mãe terra continua me ofertando estado de sítio estado de surto estado de cio. As musas podem ser Dandara, Micaela, Juliana, Mayara, Afrodite, Vênus, Gigi, Federika que o estado de poesia para com elas é o prazer, o gozo no instante da  escrita, o êxtase de chegar ao fim de um poema e a sensação da liberdade de poder descrever por onde o  imaginário viajou. Não importa se delírio ou surto. Essa luta, esse atual empoderamento feminino, é maravilhoso, para o mundo machista em que vivemos, ele me dá até mais motivações para expandir a criação com os meus personagens femininos. No livro Juras Secretas - Editora Penalux - 2018 a mulher é a grande musa a nortear a maior parte dos poemas que estão no livro. 

 certa vez em Teresina

uma menina me chamou de Torquato

pelo meu Vapor Barato

uma outra me chamou de Faustino

por entender no meu poema

um sotaque feminino 

Nos meus próximos livro O Homem Com A Flor Na Boca e Da Nascente A Foz - Um Rio de Palavras abordo com mais ênfase essas questões. 

 Tchello d´Barros - No paralelo de tudo, você sempre esteve também ligado a assim chamada Poesia Visual, seja organizando as diversas edições da Mostra Visual de Poesia Brasileira ou colaborando em projetos assim em importantes congressos e eventos em diversos Estados. Em sua percepção para quais caminhos se dirige esta modalidade poética?

Artur Gomes – Sim em 1983 criei o Projeto Mostra Visual de Poesia Brasileira e  por 11 anos realizei exposições com todas as linguagens poéticas contemporâneas, produzi muita poesia visual, colagens, criadas com retalhos, utilizando papel, tecido, letras, e utilizando a serigrafia como técnica de impressão. As exposições foram realizada em diversas e cidades do Estado do Rio de Janeiro, em São Paulo e Teresina-PI.  De 1996 a 2016 colaborei na realização da Mostra Internacional de Poesia Visual, realizada em Bento Gonçalves-RS, durante a programação do Congresso Brasileiro de Poesia.

 Tchello d´Barros - Qual a razão do fenômeno do desmatamento coletivo do monte-de-vênus?

Dandara - também conhecida como Helena de Troia 

Artur Gomes – Bem, só posso te responder essa pergunta metaforicamente, porque existe também o desmatamento de muitos montes claros espalhados por aí. Desde o início das minhas idas e vindas a Bento Gonçalves, que as deusas do vinho as virgens de Bento e de Bacco, começaram a povoar o meu imaginário e as minhas camas de vinhas. 

Para entender os porquês andei pesquisando mitologia grega, e encontrei muitas afinidades com deusas da mitologia africana, que antes eu já conhecia um pouco. O monte-de-vênus é cobiçado por deuses e deusas, para o seu desatamento coletivo existe sempre  batalhas imensas quase sempre vencidas por Helena que  me leva sempre na garupa do seu  Cavalo de Troia.

 

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Carvalho Junior - EntreVistas


 Meu contato com o Carvalho Junior no face começa em 2017, imediatamente descobri ser ele também um admirador de Macunaíma.  Aos poucos fui tomando pé da sua poesia, forte, densa e podemos até dizer Absurda, “cipoadas entre as folhagens da malícia” como ele mesmo acrescenta ao título do seu livro O Homem-tijubina – Editora Patuá 2019. Já afirmei e volto a repetir meu amor, esse projeto EntreVistas tem me oferecido a oportunidade de conhecer um pouco mais fundo essa nação imensa de poetas brasileiros.

CARVALHO JUNIOR (Francisco de Assis Carvalho da Silva Junior, Caxias/MA, 1985). Professor, ativista cultural, gestor público e poeta brasileiro. Vencedor do Troféu Nauro Machado, categoria poema, no I Festival Maranhense de Conto e Poesia (Universidade Estadual do Maranhão, 2015). Publicou os livros de poemas Mulheres de Carvalho (Café & Lápis, São Luís, 2011), A Rua do Sol e da Lua (Scortecci, São Paulo, 2013), Dança dos dísticos (Editora Patuá, São Paulo, 2014), No alto da ladeira de pedra (Editora Patuá, São Paulo, 2017) e O homem-tijubina & outras cipoadas entre as folhagens da malícia (Editora Patuá, São Paulo, 2019). Organizou a antologia Babaçu Lâmina – 39 poemas (Editora Patuá, São Paulo, 2019), tendo organizado, também, anteriormente, em parcerias, a Antologia Poetas Locais Integrantes da Noite Universal (e-book, 2019, org. com Ricardo Leão) e a antologia/caderno de poemas Quibano: 15 poetas do Maranhão (Appaloosa Books, 2017, org. com Antonio Aílton). Membro da Academia Caxiense de Letras e da ASLEAMA, pesquisa vida e obra do poeta Déo Silva. Realiza, com algumas parcerias, o sarau/encontro de poesia Na Pele da Palavra e faz parte dos coletivos de autores Academia Fantaxma e Os Integrantes da Noite. Participou com o poema Abrigos da Exposição POESIA AGORA (Itaú Cultural, Rio de Janeiro, 2017).  Foi o curador da Exposição Sementes de Poesia, em Caxias/MA, no espaço do Caxias Shopping Center (2018). Edita a página de poesia Quatetê. Integra o Conselho Editorial do Círculo Poético de Xique-Xique. Tem poemas publicados em jornais, antologias literárias e revistas do Brasil e do exterior. Possui poemas vertidos para o espanhol por Antonio Torres e por Clarissa Macedo 

 Artur Gomes - Como se processa o seu estado de poesia?

 Carvalho Junior - Ao caminhar insatisfeito com o estado de mesmice que tenta o tempo inteiro nos lançar dentro de uma arapuca, sou logo projetado para o que se poderia chamar de estado de poesia. Eu não saberia viver fora dele, pois não conseguiria respirar sem esse movimento contínuo de cismas. Penso, quase que obsessivamente, em poesia, na linha de um verso voando sobre e além da página. Como naquele verso de W. H. Auden, sinto o verso como “uma doença especial do ouvido”. Digo, em um poema do meu novo livro, a ser oportunamente publicado, que “ouvido é quintal”. Assim sendo, o meu caminho se elabora nessa rede de assuntamentos (ou de assustamentos). (risos)

 Artur Gomes - Seu poema preferido? Próprio. Ou de outro poeta de sua admiração.

Carvalho Junior - De minha autoria, eu destaco “O homem-tijubina”, poema principal do meu livro mais recente, que ousa a criação de um personagem que se confunde comigo mesmo. “Jandira”, de Murilo Mendes, está entre os meus poemas preferidos, um texto luminoso que gosto muito de ler pelas mesas de bares que frequento, como no acolhedor Bar do Juvenal.

 Artur Gomes - Qual o seu poeta de cabeceira? 

 Carvalho Junior - São muitos(as) os(as) poetas com os(as) quais convivemos. Há os(as) que nos marcam em fases diferentes da vida. Quintana e Leminski foram dois figuraças que estudei e gosto muito. Vou citar dois nomes que, hoje, me entortam para valer e fico em êxtase ao lê-los, em meio a tantos outros: Szimborska e Murilo Mendes.

 Artur Gomes - Em seu instante de criação existe alguma pedra de toque, algo que o impulsione para escrever?

 Carvalho Junior - O que me faz escrever é essa necessidade relatada de caminhar refletindo sobre o caminho. O parto de um poema, que é um outro corpo meu, é sempre um mistério, não se submete a um ritual, a uma fórmula ou receituário. Eu faço muitas anotações de ideias e em algum momento burilo, uso a faca do açougue do meu pai para cortar a carne do texto e a máquina de costura da minha mãe para cingir a ferida do verso.  

 Artur Gomes - Livro que considera definitivo em sua obra?

 Carvalho Junior - Se eu puder já falar em obra, depois de alguns livros publicados, digo que ela está em construção. Dos meus livros publicados, os dois últimos são os que mais gosto do resultado. Com no “No alto da ladeira de pedra” (2017) e “O homem-tijubina outras cipoadas entre as folhagens da malícia” (2019), conforme algumas avaliações críticas, há uma virada ascendente na minha escrita. Estou trabalhando arduamente em um projeto novo.

 Artur Gomes - Além da poesia em verso já exercitou ou exercita outra forma de linguagem com poesia?

 Carvalho Junior - Venho experimentando e tentando melhorar nas leituras/performances dos meus textos e de outros escritores. Um diálogo com a música, com a atuação, na busca de uma pulsação do poema além da página de livro.

 Artur Gomes - Qual poema escreveu quando teve uma pedra no meio do caminho?

 Carvalho Junior - A grande maioria deles têm alguma ligação umbilical com as pedras, os espinhos e as adversidades. Os poemas latejam debaixo da pele e têm, geralmente, a explosão do carnegão de seu furúnculo pela potência da dor. Há um dístico que o escrevi dentro dos olhos, com a alma toda dolorida.

 Diz o texto:

 “lágrima é eufemismo da dor,/ caco de vidro é chorar para dentro.”.

 Artur Gomes - Revisitando Quintana: você acha que depois dessa crise virótica pandêmica, quem passará e quem passarinho?

 Carvalho Junior - A crise em que estamos imersos é tão complexa que é muito difícil fazer qualquer previsão. O negacionismo, o relativismo geral, a burrice e o preconceito institucionalizados pelo necrogoverno bolsonarista... é tudo muito triste, representa mais do que passos para trás, pois os passos que estão sendo dados no país, atualmente, rumam para um turvo poço. Tenho esperança de dias mais claros, em que as janelas se abram para a luz do conhecimento e da cultura nas suas mais várias manifestações.  Que as feiuras das forças antipoéticas não avancem e o afeto voe alto como um condor.

 Artur Gomes - Escrevendo sobre o livro Pátria A(r)mada, o poeta e jornalista Ademir Assunção, afirma que cada poeta tem a sua tribo, de onde ele traz as suas referências. Você de onde vem, qual é a sua tribo?

 Carvalho Junior - Sou filho do Maranhão, carrego as marcas de um chão que possui rica tradição literária e o segredo da palavra tem uma continuidade. Agrada-me essa ideia de família, é uma perspectiva interessante. Se puder me dizer de uma família, sou do mesmo ramo de Antonio Aílton, de Luiza Cantanhêde, de Neurivan Sousa, de Déo Silva, de José Chagas, de Lucy Teixeira... seja pela origem ou por certo jogo de afinidades literárias. No entanto, a tribo vai muito além de uma dúzia de nomes.

 Artur Gomes - Nos dias atuais o que é ser um poeta, militante de poesia?

 Carvalho Junior - A militância que me empolga é a que atua em favor de uma democratização da leitura. Não sou de nenhuma forma avesso à realização de saraus, de rodas de debates e leituras em praças públicas, de eventos que façam ecoar as sementes da palavra. Sou conhecido no meu estado tanto pela produção literária como por certo ativismo que busca agregar, construir pontes entre escritores das mais variadas origens. Como costumo brincar, o poeta camelô é o que me emociona verdadeiramente. Por outro lado, o poeta bibelô me dá uma preguiça. (risos)

 Artur Gomes - Que pergunta não fiz que você gostaria de responder?

 Carvalho Junior - Se eu acredito na inspiração ou na transpiração, no verso medido ou no verso desmedido... ?

 (risos) Pura provocação. A entrevista foi ótima. Um grande abraço de poesia e afetividade deste vosso amigo.

 

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domingo, 20 de setembro de 2020

Lourença Lou - EntreVistas

 


Meu contato com a Lourença Lou, se dá através do face, como tantos outros. Esta semana o seu poema Pantaneiro me chamou a atenção, não apenas pelo foco da poética, mas também pela forma do uso  a linguagem para expor uma tragédia. Aí, lhe propus a EntreVista e acabei descobrindo que as afinidades com o que penso e faço sobre poesia, são muito mais profundas do que a primeira vista poderia imaginar.

 

Lourença Lou - é mineira, professora e administradora. Às vezes é prosa, quase sempre, poesia. Participou de inúmeras coletâneas, Livros da Tribo, revistas e jornais literários, impressos e virtuais, com poemas, crônicas e contos. Publicou três livros de poesia pela Editora Penalux: Equilibrista (2016), Pontiaguda (2017), Náufraga (2018). Este ano, publicou seu primeiro livro de contos – O insuspeitável perigo do instante-beijo e outros contos – pela editora Arribaçã.

 Artur Gomes - Como se processa o seu estado de poesia?

 Lourença Lou - Hoje, a poesia é uma característica latejante da minha personalidade. Como um corte que pulsa na carne, independente do momento e do lugar ou de se transformar efetivamente em algo concreto.

 Nem sempre faço poemas. Às vezes, apenas escrevo um ou outro verso que guardo ou perco nas inúmeras e embaralhadas pastas do meu computador. Outras, o poema me surpreende ao ganhar uma vida independente, muitas vezes surpreendente, quando segue uma direção que eu não apontei.

 Artur Gomes - Seu poema preferido? Próprio. Ou de outro poeta de sua admiração.

 Lourença Lou - Tenho incontáveis poemas preferidos – desde clássicos a contemporâneos. E esta preferência é cíclica. Sigo me apaixonando pelos poemas e as últimas paixões são sempre as mais profundas. Neste exato momento, acabei de ler e me apaixonar por este:

 Muito além dos corvos

 Fábio Casemiro

 

Eu que não dou conta desse mundo polifônico, 

cheio de fantasmas cantantes

Esquálidos esquifes dizendo eu sou.

 Já eu, não. Não sou nem isso, nem aquilo.

Eu sou o outro que olha o mundo pela janela de 
dentro,

 Da prisão eu sinto como porta cada barra da grade

 da vida.

 Nessa prisão de almas em vídeo clipe, inferno de 

Dante, a saída é entrando cada vez mais. Quem 
poderá diante do deus faminto, erguer suas hastas 
em hostes, entre hashtags ou óstias ?

 Esse é o fim, meu doce amigo. O fim já estava lá dentro, 

a fruta dentro da casca gritava zumbindo como 
mosca: podres todas as canções.

 Sem você ao meu lado, o chão é mole como cera. 

Como

São mais moles agora as placas da história,

Se o poeta soubesse,

 Ele cantava todas as canções de caçada,

Regadas a vinho falerno,

Nos aquecia com mais histórias,

Urubu cabeça de martelo

 E não nos deixava no inverno desses nossos dias

Eu não teria jamais o deixado ir, ainda mais

No dia santo do lagarto rei.

 É noite, minha alma se aclara,

O véu da madrugada se volta contra os 
achacadores de revolta e volta

A nos assombrar com o vívido véu da morte.

 Com sorte, minha consorte nos trará sonhos para o

 convescote

 A morte

A morte quer o mundo e eu,

Simplesmente,

 Só sei desobedecer com a arte,

Os doces espantalhos no meu quintal.

 Artur Gomes - Qual o seu poeta de cabeceira? 

 Lourença Lou - Tenho vários. Um deles, talvez o mais lido, é sem dúvida Drummond. Me apaixonei pelo livro “A rosa do povo” muito antes de escrever poesia. Daí, virei uma leitora voraz do meu conterrâneo. Mas leio com frequência: João Cabral, Hilda Hilst, Ezra Pound, Rimbaud, Bukowski, Pessoa, Maria Teresa Horta, Maiakovski, Mallarmé, Chico Buarque, Eucanaã Ferraz e mais alguns. Leio também vários poetas amigos. Alguns, gosto demais.

 Artur Gomes - Em seu instante de criação existe alguma pedra de toque, algo que o impulsione para escrever?

 Lourença Lou - Como disse, a poesia vive latejando em mim. Especialmente a poesia erótica – embora no momento eu a esteja ignorando. Então tudo e qualquer coisa vira pedra de toque. Ainda não sei muito de poesia, mas o que sei devo a Linaldo Guedes, Paulo Bentancur e atualmente a Claudio Daniel, com quem faço oficina e com quem estou aprendendo a me jogar em novas experiências poéticas. E apesar das inúmeras fontes de inspiração que é o dia a dia neste nosso país,  estabelecer um tema e uma estratégia poética tem me divertido - embora nem sempre eu consiga bons resultados. Enfim, sigo escrevendo de qualquer jeito.

 Artur Gomes - Livro que considera definitivo em sua obra?



Lourença Lou
  - Sem dúvida, o meu próximo livro: “Há muito não te desenho elefantes – poemas do amor e da guerra”. Embora eu goste muito do meu primeiro livro, Equilibrista, que tem o aval de três grandes poetas – Leila Míccolis, Paulo Bentancur e Wander Porto – nunca reescrevi tantas vezes um livro, como tenho feito com este que teve a publicação adiada pela pandemia.  Talvez ele seja o último, por isso eu o veja como definitivo.

 Artur Gomes - Além da poesia em verso  já exercitou ou exercita outra forma de linguagem com poesia¿

 Lourença Lou - Minhas primeiras investidas na poesia foram através da prosa poética, influenciada por tudo que li e reli de Clarice Lispector. Cheguei mesmo a iniciar algo parecido com um romance. Abandonei quando descobri que podia escrever poemas. Definitivamente, fiquei presa nos versos. É onde tenho liberdade para costurar minhas sobrevivências.

 Artur Gomes - Qual poema escreveu quando teve uma pedra no meio do caminho?

 Lourença Lou - Vários. Haja pedras! Este é um dos últimos:

 

quando a ordem é resistir

 

faz anos

parte de mim grita rouca

enquanto a outra

rasga inutilmente as vestes

a cada morte embalada

no conceito arraigado

que homens são pontos finais

 

não me digam o que devo matar

o grito rascante não impede

que a língua se torne navalha.

 

Artur Gomes - Revisitando Quintana: você acha que depois dessa crise virótica pandêmica, quem passará e quem passarinho?

 Lourença Lou - Quando eu era ainda bem jovem lutei pela certeza de que conseguiríamos livrar este país da mão pesada do AI-5. Continuo com a mesma certeza: os fascistas passarão. Nós, passarinhos, continuaremos caminhando e cantando e seguindo a canção”.

 Artur Gomes - Escrevendo sobre o livro Pátria A(r)mada, o poeta e jornalista Ademir Assunção, afirma que cada poeta tem a sua tribo, de onde ele traz as suas referências. Você de onde vem, qual é a sua tribo?

 Lourença Lou - Não sei se faço parte de alguma tribo. Sou uma leitora compulsiva que um dia não deu conta de guardar o mundo dentro de si. Por acaso virei poeta, cronista, contista. Mas sou mesmo é apaixonada pelos escritores que já citei e mais algumas dúzias de outros. E pela poesia.

 Artur Gomes - Nos dias atuais o que é ser um poeta, militante de poesia?

 Lourença Lou - Eu me vejo como uma eterna militante de poesia. Para mim, ser militante é ter poesia no sangue. É viver pisando em brasas, abraçar o sentimento do mundo, cutucar feridas, expulsar assombrações, escrever sem medida. 

 Artur Gomes - Que pergunta não fiz que você gostaria de responder?

 Lourença Lou - Artur, sou um bicho-do-mato que só se sente à vontade em seu pequeno mundo. Quando você me convidou para esta entrevista, quase desisti. Seria sair da casca para um mundo muito além de mim e que nem sempre me interessa. Sou uma desconhecida e, embora tenha mania de publicar livros, não sei se quero deixar de ser. Entretanto, foi uma grata surpresa. Me senti à vontade, como se estivéssemos batendo papo. E satisfeitíssima por ter chegado até aqui. Te agradeço muito pela oportunidade e atenção. Gostei demais.

 

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