Diego interpretando Federico Baudelaire
em LeminskiAndo Em Cena
Com a criação da Mocidade Independente de Padre Olivácio - A
Escola de Samba Oculta No In-consciente Coletivo, Federico Baudelaire foi
alçado ao cargo de Mestre/Sala e por longos 10 anos nosso encontros foram
permanentes, nos ensaios, desfiles e assembleias. Mas aí veio o seu
desentendimento quase arranca rabo com Pastor de Andrade, por conta da não
re-eleição de Gigi Mocidade para Rainha da Bateria da MIPO, rasgaram a ata da
assembleia, e o impasse permanece até hoje.
Welton Martini interpretando
Federico Baudelaire em A Nossa Casa É Um Teatro
Em 2005 outra vez por
esses descuidos do acaso do destino nos re-encontramos em Curitiba, antes em
1994 já havíamos estados juntos no desfile da Unidos do Botão, a convite do
Hélio Letes, que agora é Leites. Por mais um tempo perdidos das entre vistas,
voltamos a nos ver em 2015, num encontro dos acasos ou conspiração do cosmo em
PortoViejo, na Bolívia.
Estava eu, em Corumbá, Mato Grosso do Sul, compondo a Comissão Julgadora dos desfiles das Escolas
de Samba e na segunda feira de carnaval resolvemos pegar uma van e atravessar a
fronteira para dar uma espiada no carnaval da Bolívia, e eis lá se deu o
encontro sagrado para a criação da
Igreja Universal do Reino de Zeus.
Artur
Gomes - consta no face que você nasceu em Itabira, confere¿
Federico
Baudelaire - na verdade Itabira é um acidente de percurso. Eu nasci
mesmo em Araraquara, meu pai (que prefiro não citar o nome para não entregar),
estava separado da minha mãe, que eu nem conheci. Do seu outro casamento havia
um meio irmão pedante e ciumento. Aos 7 anos fui adotado por Drummond, que me
levou para o Rio de Janeiro. Como não me acostumei a ficar trancado os dias inteiros
dentro de livros na Biblioteca Nacional, então ele resolveu me levar pra
Itabira, onde fiquei até os meus 15 anos, na casa de minha mãe de criação.
Artur
Gomes - Como você foi parar em Campos nos anos 70?
Federico
Baudelaire - Bem, com 15 anos coloquei mochila nas costas e peguei
estrada. Era comum na época, viajar de carona e acampar próximo a sítios,
montanhas, cachoeiras. Eu estava aprendendo a tocar violão, e de repente quando
dei por mim estava em Itaperuna no Estado do Rio de Janeiro, e lá conheci Vitor
Meireles (o pardal), que estava querendo formar uma banda, mesmo sem ter muita
prática de violão ainda, foi a minha primeira incursão com música. Depois de
algumas apresentações nos bares e nos clubes de Itaperuna, Vitor resolveu ir
tentar a sorte em Campos, e me carregou na bagagem.
Artur
Gomes - Quando você começou a frequentar terreiros de umbanda?
Federico
Baudelaire - Foi por influência do Pardal, toda a família dele tinha
uma ligação com a mediunidade, mas em Itaperuna eu nunca tinha ido a nenhum
centro. Em Campos foi a primeira vez, naquela noite de 1974 quando nos
conhecemos.
Artur
Gomes - Por quanto tempo você ficou morando em Campos?
Federico
Baudelaire - Durante os anos que existiu a Turma do Campo, acho que
uns 4 anos depois, até 1979 mais ou menos. Ainda me lembro dos Festivais de
Música até 1980 em Miracema. Depois caí na estrada novamente. Quis ir pra
Marília, onde meu pai lecionava, mas acabei indo parar em Cerquilho, morar com
Mariana uma namorada que conheci em Registro. Era um mar de fogo, foi ela quem
me levou a incursionar pela poesia,
paixão avassaladora. Nunca mais tive outra igual, apesar que os 6 anos vividos
com Gigi foram vulcânicos também.
Artur
Gomes - Como você foi parar em Batatais em 1987?
Federico
Baudelaire - Eu tinha conhecido
o Gariel de La Puente, em Assis, e desde que o conheci colaborei com a sua
revista de contos: FURAPRHOYDI. Em 1985 era para ter ido a Jadinópolis no
encontro que ele organizou mais não foi possível, estava tentando exame para
comunicação na PUC , e levei pau,
passava por um momento de grande depressão. Em 87 Gabriel me convenceu e lá
fui eu mergulhar naquela fogueira que
foi a semana em Batatais. Foi lá o último encontro que tive com o meu pai, na
fazenda onde ficamos hospedados, com mais alguns poetas, entre eles: Hugo Pontes,
Paulo Bruscky, Ricardo Pereira Lima, Jorge Mautiner, Nelson Jacobina, Cesar
Augusto de Carvalho, e o cineasta Guilherme Almeida Prado.
Artur
Gomes - E por quê não nos encontramos Registro em 1990, e fomos
nos encontrar em Outro Preto naquele mesmo ano?
Federico
Baudelaire - A Mariana, é filha de uma família tradicionalíssima de
lá, japoneses cultivadores de chá e banana, zen budistas, ela ficou com receio
dos seus pais não aprovarem o nosso relacionamento. Em setembro de 1990 já
estávamos morando em Ouro Preto, Mariana cursava arquitetura na Federal de lá.
Artur
Gomes - Mas naquele ano mesmo começou o seu romance com Gigi na
Mocidade Independente?
Federico
Baudelaire - Não. Lá em Ouro Preto começou o nosso contato, e a partir
dali um bom período de trocas de cartas. Só fui para Campos em 92 para o
primeiro desfile da Mocidade, e por lá fiquei até o desentendimento com Pastor
de Andrade, em 2002. Aí botei a mochila nas costas novamente. Primeiro baixei
em São Paulo, tinha feito uma Oficina de Artezanato com o Hélio, na Oficina
Cultural Oswald de Andrade, e pensei que ele ainda estivesse por lá, como não
estava fui procurá-lo em em Curitiba e
por fim e fui parar na Bolívia, até nos re-encontrarmos em 2015.
Artur
Gomes - Vamos deixar de
lado agora o pessoal e entrar na sua vida de poeta, a apesar de achar que elas
se confundem. Como se processa o seu estado
de poesia?
Diego com Rachel Rosa, se preparando para interpretar
Federico Baudelaire em Leminskiando Em Cena.
Federico
Baudelaire - Primeiro eu tenho que me localizar em que estado me
encontro. dependendo desse estado, é uma música, uma palavra que desconforta ou
desconcerta, um fora de uma porta bandeira qualquer. Quando você me colocou para
contracenar com Clarice, por exemplo, o meu estado era de desvario pleno, pois
pensava encontrar na minha frente uma mulher madura, quando me vi diante
daquela lindura, que era a Rachel Rosa logo pensei em Wally Salomão - :
"me segura que eu vou ter um troço". Na verdade, não tem uma coisa
lógica, racional. Acabo de ler uma entrevista que você fez com Fábio Pessanha,
que me encantou, me vi muito ali naquelas figuras de linguagem que ele coloca
como exercício de escrita.
Artur
Gomes - Seu poema preferido? Próprio. Ou de outro poeta de sua
admiração.
Federico
Baudelaire - meu. não que seja o melhor, mas tem um grande
significado pela motivação da escrita, pelo local onde foi escrito e o fato que
o motivou. eu estava oculto em Bento Gonçalves-RS ano de 1996, primeira edição
do Congresso Brasileiro de Poesia, lá, onde reinava Afonso Romano de Sant´Anna, Fernando Aguiar, Hugo Pontes, Clemente Padin e Virgílio Lemos. Essa minha incursão pelas virgindades poéticas de Bento me rendeu 6 anos de cartas
incendiárias trocadas com uma musa que conheci no hall do Hotel Dallonder numa madrugada inteira de poesia
desfloração
teu corpo é carne de uva
meu líquido - vinho
como chuva - molha teu corpo
de dentro
no altar sagrado dessa casa de pedras
esse vale agora secreto
testemunha do ato profano
a cada segundo dessas horas
em nossos corpos carnaval
em que desfolho teu bem-me-quer
e cheiro as flores do mal
de outros: são dois que não me largam, O Corvo, Edgard Alan
Poe e Cântico dos Cânticos Para Flauta & Violão, Oswald de Andrade.
Artur
Gomes - Qual o seu poeta de cabeceira?
Federico
Baudelaire - tenho vários. depende muito do estado de poesia que eu
queira desbravar naquele instante em que me jogo numa cama, só, ou acompanhado.
quando só, toda a troup da poética brasileira contemporânea, ou até mesmo
alguns anteriores. quando acompanhado gosto de ter na cabeceira as poetas: Ana
Cristina César, Olga Savary, Hilda Hilst, são poetas que me apunhalam, me
exploram e ao mesmo tempo me esporam. Gosto das per-versas as que maltratam, para
mostrar a quem deitou comigo que o amor se faz por todos os sentidos, mesmo
muitas vezes não tendo sentido algum.
Artur
Gomes - Em seu instante de criação existe alguma pedra de toque,
algo que o impulsione para escrever?
Federico
Baudelaire - o toque do corpo a
corpo na carne da palavra. isso apesar de não ser o bastante, é o que pode ser
a tecla propulsora de uma criação. agora mão gosto de pedra de toque. Uilcon
Pereira tinha a mania de falar no livro de capa preta, como essa pedra de
toque. O que na verdade nunca soube exatamente o que era para ele. muitas vezes
para mim a pedra de toque é a própria palavra que preciso naquele determinado
momento da vertigem. e essa citação do Herbert Emanoel é bem adequada para o
que penso a respeito do instante da criação: "o poema é a espantografia da
linguagem". Isso para mim significa que o ato de escrever é um estado de
êxtase. não sei criar em outro estado.
Artur
Gomes - Livro que considera
definitivo em sua obra?
Federico
Baudelaire - não é um livro,
minha obra está marcada pela minha trajetória nos desfiles da Mocidade
Independente de Padre Olivácio - e para mim tem um desfile definitivo que é o
de 1992 em Campos dos Goytacazes, com a banda do Boi Capeta, e no verão de 1993
no Farol de São Tomé, com o Boi Chupeta. Desfilar com aquele Samba Enredo - :
Federika A Porta Bandeira Que BorTou Olivácio Doido, foi a glória total para um
mestre/sala anarco como eu.
Artur
Gomes - Além da poesia em verso
já exercitou ou exercita outra forma de linguagem com poesia?
Federico
Baudelaire - poesia em verso escrevo muito pouco. tenho algumas
incursões como ator de teatro, e na minha estada na Bolívia fiz curso de
cinema, aproveitando umas experiências que tinha feito em São Paulo na Boca do
Lixo, enquanto Guilherme filmava Perfume de Gardênia, que antecede A Dama Do
Cine Xangai. Hoje escrevo alguns salmos para as festas das Bacantes da Igreja
Universal do Reino de Zeus, principalmente para os discursos de Dionísio nos
seus encontros com Vênus quando ela se transforma em Afro-dite-se-quiser. são as epístolas
das minhas sagradas escrituras. também vez por outra escrevo prosa
poética quando re-visito os quintas de Assombradado, com re-leituras da trilogia
No Coração dos Boatos, de Uilcon Pereira e em textos para entrevistas.
Artur
Gomes - Qual poema escreveu quando teve uma pedra no meio do
caminho?
Federico
Baudelaire - esse tempo em que estamos vivendo é a própria
pedra no meio do caminho. mas o primeiro impasse que tive na vida e que percebi
uma pedra do nomeio do caminho tirei de letra com esse poemeto:
não prego prego sem estopa
não uso óculos de garfo
só tomo sopa de colher
ninguém me ama
ninguém me quer
ninguém me chama
federico baudelaire
no momento me veio a lembrança as ironias de Nicolas Bher
com o seu livreto Yogurte Com Farinha que tinha lido no início dos anos 80.
Artur
Gomes - Revisitando Quintana: você acha que depois dessa crise
virótica pandêmica, quem passará e quem passarinho?
Federico
Baudelaire - de verdade. não sei dizer. tenho andado bem pessimista
com esse estado de coisas. vez em quando me vem a mente e assovio umas canções
do Belchior, e um dos seus refrões que não sai da lembrança desde a primeira
vez que ouvi -
:
"tenho sangrado demais
tenho
chorado pra cachorro
ano
passo eu morri
mas
esse ano eu não morro". -
Artur
Gomes - Escrevendo sobre o livro Pátria A(r)mada, o poeta e
jornalista Ademir Assunção, afirma
que cada poeta tem a sua tribo, de onde ele traz as suas referências. Você de
onde vem, qual é a sua tribo?
Federico
Baudelaire - bem acho que a minha tribo está na estrada. na geração
beat, hippie, alucinógena, já experimentei quase de tudo. nos anos 70 aprendi a
encarar o mundo com Janis Joplin, Jimmi Hendrix, Bob Dylan. sou mais ligado a audição. a música é o que me
alimenta e ao mesmo tempo me desconcerta desconforta mas também me impulsiona.
Quando comecei a ouvir Caetano, Gil, Tom Zé, Gal, Mutantes, o Terço, o comecei a perceber que o
barato era total. foi como se
um trem de ferro passasse lotado a todo vapor por minhas estações dos
desencontros.
Artur
Gomes - Nos dias atuais o que é ser um poeta, militante de
poesia?
Federico
Baudelaire - para mim ser poeta é ser Mestre/ Sala da Mocidade
Independente de Padre Olivácio. é lá que ainda me encontro, lá é o meu lugar de
ser e de estar. onde encontrei a minha grande paixão, o meu poema carne osso e
não vai ser um Pastor de Andrade que vai ser o exterminador do meu futuro.
quanto a isso sou otimista, ser poeta é ter também a picardia a teimosia e não
desistir dos seus sonhos mesmo que estejam mais para o impossível.
Artur
Gomes - Que pergunta não fiz que você gostaria de responder?
Federico
Baudelaire - pensei que fosse
perguntar o nome do meu pai. Mas mesmo se me perguntasse eu não iria
dizer, em respeito a sua memória e ao seu descanso eterno.
Fulinaíma
MultiPtojetos
portalfulinaima@gmail.com
(22)99815-1268 - whatsapp
Nenhum comentário:
Postar um comentário