Comecei a ter contato com a
poesia de Sérgio de Castro Pinto, no ano 2000, quando ele venceu o II
FestCampos de Poesia Falada com "camões/lampião". Logo depois sua
poesia foi publicada em uma das antologias com a seleção das 100 melhores
poesia do século 20. Desde então nunca mais perdi sua poesia de vista, e como grande
admirador, leio e re-leio os seus livros que tenho em mãos: "A Flor do Gol" e "Folha Corrida",
e em publicações as quais tenho acesso.
Em recente postagem na revista Mallarmargens além do conteúdo da sua poesia me chamou a atenção essa sua sua afirmação: "eu sou a pane e a interferência dos
meus fantasmas".
E também essa observação da Amanda Vital na entrevista que me concedeu, falando que o seu poema preferido é:
“Esta Lua”, do Sérgio de
Castro Pinto. Por toda a beleza e a genialidade do Sérgio em escrevê-lo, pelo
domínio absurdo das palavras. Esse poema é uma obra de arte: “esta
lua turca cai feito uma luva/na praia da urca, na pedra da gávea (…)”.
Muita gente considera o poema da pedra, do
Drummond, como o poema das suas vidas, aquele poema icônico, emblemático,
gravado na memória. O meu “poema da pedra” do
Drummond é esse poema do Sérgio.
Sérgio
de Castro Pinto nasceu em João Pessoa, Paraíba, no ano de 1947.
É professor titular aposentado do Departamento de Letras da Universidade
Federal da Paraíba. Defendeu dissertação de mestrado e tese de doutoramento
sobre Manuel Bandeira e Mario Quintana, respectivamente. Entre os seus livros
de poesia figuram, entre outros, A Ilha
na ostra, O Cerco da memória, A Flor do Gol o recente Folha
corrida (1967-2017), poemas escolhidos, Editora Escrituras, São Paulo.
Publicou alguns livros de ensaios, a exemplo de Longe daqui, aqui mesmo – a
poética de Mario Quintana
(Editora Unisinos, São Leopoldo, Rio Grande do Sul, 2000), A Casa e seus arredores
(Editora Manufatura, 2004) e O Leitor
que eu sou (Editora Ideia, 2014, João Pessoa, Paraíba). Ainda este ano lançará O Leitor que escreve.
Artur
Gomes - Como se processa seu estado de poesia?
Sérgio de Castro Pinto - Numa
espécie de estado de sítio, com todos os sentidos em prontidão e com a alma em
riste, mas plenamente cônscio de que
“nem
sempre o poeta/ ronda o poema/ como uma fera a presa”/, pois, “às vezes, fera presa e acuada/ entre as
grades do poema-jaula, / doma-o o chicote das palavras”. (“poeta x poema”, do meu livro “O
Cerco da memória”)
Artur
Gomes - Seu poema preferido?
Sérgio
de Castro Pinto - Não é que seja o meu poema preferido, mas é
um deles: “camões/lampião”, que,
inclusive, obteve o primeiro lugar no
ano 200 no II FestCampos de Poesia Falada
de Campos de Goytacazes (Rio de Janeiro), tão bem coordenado por você, poeta.
Esse poema, além de figurar em várias antologias aqui e no exterior, evoca os
anos dourados de minha juventude, uma vez que o escrevi quando contava apenas
vinte e um anos de idade.
Artur
Gomes - Qual o seu poeta de cabeceira?
Sérgio
de Castro Pinto - Na minha cabeceira transitam muitos poetas,
pois me tornei eclético, aprendi a conviver tanto com a “poesia do menos” de João Cabral de Melo Neto quanto com a poesia
caudalosa de Augusto Frederico Schimdt. Na esteira de Manuel Bandeira, também aprendi
a acolher os maus poetas, pois nestes, “mais
do que nos bons, se acusa o que devemos evitar”. Portanto, longe de mim o
comportamento excludente das vanguardas, sempre pródigas em alijar sumariamente
os que não cumpriam à risca os seus breviários estéticos.
Artur
Gomes - Em seu instante de criação existe alguma pedra de toque,
algo que o impulsiona para escrever?
Sérgio
de Castro Pinto - Uma das pedras de toque é a rua, o corpo a corpo com a
rua, com a “marca suja da vida”.
Outra, a do gabinete, a pedra de toque da leitura, do corpo a corpo com a
linguagem de autores com os quais dialogo, pois creio que um poema se inicia a
partir do instante em que outro poema é dado como concluído. Aliás, comparo o
poema a um bastão dessas corridas de revezamento, cujo atleta o passa a outro
atleta e este a mais outro, mais outro, e assim sucessivamente, até o infinito.
Artur Gomes - Escrevendo
sobre o livro “Pátria A(r)mada, o poeta e jornalista Ademir Assunção, afirma que cada poeta tem a sua tribo, de onde ele
traz várias referências. Você de onde vem, qual é a sua tribo?
Sérgio
de Castro Pinto - Venho de João Cabral de Melo Neto, das vanguardas. Adolescente, à poesia musical de Cecília
Meireles se opôs a antilira de Cabral. E se opôs como uma pedra cuja difícil
configuração estivesse a exigir um longo aprendizado. Tanto que, para
apreendê-la melhor, removia-a para dentro dos meus poemas.
Mas se principiava
aí uma árdua “educação pela pedra”,
fazia-o sem amargar a “angústia da
influência” de que fala o crítico norte-americano Harold Blum. E tinha pelo
menos um motivo para tanto: se o primeiro João Cabral não se mostrou imune às
influências, por que eu haveria de sê-lo, contando menos de dezoito anos de
idade? Estava em boa companhia, como de resto todos ou quase todos os da minha
geração, pois dificilmente alguém conseguia passar incólume à personalidade
marcante do poeta pernambucano.
Eu quero crer que neutralizei a
presença de Cabral quando vi chegada a hora de “reinventar a seriedade pela
zombaria”, quando passei a adotar o humor e a ironia como pontos de partida
do meu discurso poético.
Artur
Gomes - Nos dias atuais o que é ser um poeta militante, militante
da poesia?
Sérgio
de Castro Pinto - Quando, no meu caso, prestes a completar setenta e três
anos de idade, ainda persevera em fazer poesia. A propósito, quando dos meus
setenta anos, escrevi “o poeta septuagenário”, poema que serve de epígrafe ao meu livro “Folha corrida – poemas escolhidos” (1967-2017), Editora Escrituras, São Paulo,
2017.
o poeta
arrasta
os pés
e tropeça
nos versos
de pés
quebrados.
o poeta
não mais
se inspira.
o poeta
só inspira
cuidados.
A respeito, numa palestra
destinada a jovens estudantes, escrevi: “Benfazejos
arroubos os da juventude, a soberba desmedida dos jovens, virtudes sem as quais
teríamos nos extraviado dos caminhos sempre tortuosos e íngremes da poesia. A
perseverança, hoje, talvez seja o vocábulo mais exato para substituir as efusões
da juventude perdida. Perdida? Não, pois creio que ela ainda permanece na minha
devoção à palavra, na minha profissão de fé na poesia! ”
Artur
Gomes - Livro que considera definitivo na sua obra?
Sérgio de Castro Pinto - Alguns poetas têm por hábito renegar o primeiro
livro. Eu, não: o acolho e o prezo, pois do primeiro ao mais recente, todos
integram um processo, uma trajetória que cabe ao público leitor e à crítica
considerarem ascensional ou não. Só não gostaria que dissessem que o melhor da
minha obra é “Gestos lúcidos”, meu
livro de estreia, pois aí, ao invés de uma trajetória ascensional, teria
cumprido um percurso francamente descensional.
Difícil escolher um livro
definitivo dentre os que escrevi. Quando muito, na poesia que me foi possível
realizar, creio que alguns poemas se destacam, embora estejam longe de serem
definitivos.
Artur
Gomes - Além da poesia em verso, já exercitou ou exercita outra
forma de linguagem com poesia?
Sérgio de Castro Pinto - O meu conto “Cantilena” conquistou uma das premiações do Concurso Nacional de Contos do Paraná. À época, tinha vinte e
quatro anos de idade. E quando recebi o resultado, não consegui conciliar o
sono, tal a euforia que me tomou conta. Foi um caso típico de “insônia feliz”, para usar de uma
expressão de Mário de Andrade.
Pois bem. Eu, que até então
somente cultivara a poesia, passei a investir no conto, gênero do qual era um
leitor devoto, voraz e veraz. Aos poucos, porém, fui chegando à conclusão de
que essa não era a minha praia. E que a premiação consistira num simples
acidente de percurso, pois “Cantilena”
guarda muito mais semelhança com a poesia do que com a ficção. Em última
análise, é um conto poético, cheio de imagens, metáforas, alegorias, como bem
disse o escritor paranaense e professor emérito de várias universidades
europeias, Temístocles Linhares, em
artigo publicado na revista “Letras”,
volume 20, 1972, da Universidade Federal do Paraná:
“(...) a força dos novos que ingressam no gênero! O primeiro nome a
mencionar é o do Sr. Sérgio de Castro Pinto, da Paraíba, autor já de dois
livros de versos. Aqui ele continua poeta, mas poeta sensível aos objetos, que
se manifesta sob a forma gustativa, através de uma sensibilidade específica e
elaborada, em que entra uma ponta de sensibilidade estética, uma vibração de
‘todos os sentidos fundidos num só’”.
Temístocles
Linhares foi um dos jurados do Concurso Nacional de Contos do Paraná,
em 1971, ano em que conquistei um dos prêmios.
Artur
Gomes - Qual poema escreveu quando teve uma pedra no meio do
caminho?
Sérgio
de Castro Pinto - Para escrever, tenho que remover a pedra ou
as pedras que obstruem o meu caminho. Só com o caminho livre e desimpedido é
que consigo escrever.
Artur
Gomes - Revisitando Quintana: Você acha que depois dessa crise
virótica pandêmica, quem passará e quem passarinho?
Sérgio
de Castro Pinto - Graúdo, destrambelhado, invejoso, fascistóide, o passarão
pertence a uma fauna que jamais será extinta, pois ele sempre irá existir
em todos os tempos e lugares, quer no contexto político, quer no literário,
quer, ainda, no âmbito de toda e qualquer atividade humana. Diferentemente do
poema de Quintana, cumpre aos passarinhos, num coro uníssono e
mavioso, sentenciar: “Passarão, não passarás! ”
Artur
Gomes - Que pergunta não fiz que você gostaria de responder?
Sérgio de Castro Pinto - Poeta, as perguntas foram excelentes. Agradeço
a lembrança do convite para ser entrevistado.
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Excelente entrevista deste excelente poeta, Sérgio de Castro Pinto. Parabéns!
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