quarta-feira, 29 de abril de 2020

Marcelo Mourão - EntreVista



Marcelo Mourão é outro poeta que comecei a ter contato através do face, e a partir de 2018 nos conhecemos pessoalmente quando comecei a frequentar o Sarau POLEM, onde fiz lançamentos no Rio de Janeiro do meus livros Juras Secretas em 2018 e Pátria A(r)mada em 2019. Foi no POLEM, na Taberna de Laura, que surgiu a ideia da Balbúrdia Poética, nome sugerido por Sady Biachin. Além de poeta, escritor e crítico literário Marcelo Mourão é um grande ativista e estudioso da produção poética  carioca dos anos 80, seu livro Rotas e Rostos é um bom raio x dos movimentos poéticos no Rio de Janeiro nessa década.  Uma das grandes edições do POLEM em que estive presente, foi exatamente sobre a poesia dos anos 80 realizada em outubro de 2019 na Taberna de Laura, em Copacabana - Rio de Janeiro.

Marcelo Mourão é professor graduado em Letras (Língua Portuguesa e Literatura), pós-graduado em Literaturas de Língua Portuguesa pela Universidade Estácio de Sá (Unesa) e em Literatura Brasileira pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Em 2020, tornou-se mestre em Literatura Brasileira, pela UERJ. É também poeta, escritor, pesquisador, crítico literário e produtor cultural. É o criador, produtor e apresentador do sarau POLEM, iniciado em 2008 no Leme (RJ). É, desde 2019, o diretor de comunicação da União Brasileira de Escritores (UBE-RJ). Há textos seus publicados em várias antologias, periódicos literários, sites e revistas acadêmicas, do Rio e de outros estados brasileiros. Em 2018, organizou a coletânea comemorativa POLEM 10 anos, lançada pela Ventura editora. Possui quatro livros solo editados antes deste: O diário do camaleão, poesia (2009); Temas em literaturas de língua portuguesa: os diferentes olhares, crítica literária (2015); Máquina mundi, poesia (2016); e Rotas e rostos: questões de literatura brasileira, crítica literária (2019). 

Artur Gomes - Como se processa o seu estado de poesia?

Marcelo Mourão - Antigamente, acreditava que era preciso esperar a inspiração chegar. Hoje em dia, depois de dez anos de dedicação aos meus estudos literários e, principalmente, praticando bastante a minha própria literatura, resolvi experimentar o que muitos poetas fazem: escrever todos os dias, com disciplina, com horários fixos, sozinho em meu escritório, tendo inspiração ou não. E, olha, tem dado muito certo. Tenho escrito muitas coisas interessantes. Claro que também sempre surgem escritos ruins no bojo da produção. Porém, é preciso, depois, saber filtrar e publicar somente aqueles que alcançaram bons resultados finais, bons índices de literariedade.

Artur Gomes - Seu poema preferido?

Marcelo Mourão - Meu? Se for meu, possuo bem mais de um preferido. Fica injusto citar apenas um. Então acho melhor nem mencionar. Se for poema de algum outro autor, aponto aqui mais de um também: “Meu pai” e “Flor amarela”, de Ivan Junqueira e “Poema de sete faces” e “Morte do leiteiro”, de Carlos Drummond de Andrade. Porém, quero deixar aqui registrado que há ainda muitos outros que amo, de vários outros autores.

Artur Gomes - Qual o seu poeta de cabeceira?

Marcelo Mourão - Muitos também! (Risos)
Vamos lá: Carlos Drummond de Andrade, Ivan Junqueira, Fernando Pessoa, Charles Baudelaire, Augusto dos Anjos, Federico García Lorca, Bertolt Brecht, Vladimir Maiakóvski, Manuel Bandeira, Mário Quintana, Hilda Hilst, Paulo Leminski, Roberto Piva,  João Cabral de Melo Neto e Álvares de Azevedo. Chega, né? (risos) Melhor parar por aqui. Mas, o Drummond é, com certeza,aquele que mais me influencia, embora ame todos esses outros também.

Artur Gomes - Em seu instante de criação existe alguma pedra de toque, algo que o impulsione para escrever?

Marcelo Mourão - Antigamente, antes de me aprofundar nos estudos literários, uma emoção, seja ela qual fosse, bastava para ser o gatilho queria disparar a vontade de escrever. Hoje em dia, mais maduro como artista, concordo com João Cabral de Melo Neto e acredito, assim como ele, no planejamento metódico do poema, em arquitetá-lo minuciosamente, desde o recorte de seu tema até a sua última revisão, seu último retoque de correção. É preciso acrescentar que todos os poemas precisam ser trabalhados.  Nenhum texto nasce sem precisar de consertos. Uns até surgem mais próximos do ideal e outros, pelo contrário, precisam de muito suor, de muito esforço para ser considerados prontos. Bilac estava certo: é um trabalho resignado (“monástico”, segundo a descrição dele em certos poemas), de ourivesaria. É uma difícil artesania, como costumo definir ou, se você preferir, é poiésis, como gostavam de intitular os gregos antigos.

Artur Gomes - Livro que considera definitivo em sua obra?

Marcelo Mourão -  Por enquanto, o Máquina mundi, meu segundo livro de poemas. É, com certeza, a mais madura das duas obras poéticas que lancei até hoje. Ele ganhou o prêmio de livro do ano/2016 na União brasileira de escritores (UBE-RJ) e foi alvo de mais de 12 resenhas de críticos espalhados pelo Brasil todo. Foi um grande sucesso de público e crítica. Porém, pelo que estou sentindo, o terceiro, que já está em fase avançada de produção, me parece que irá superar o Máquina em termos de amadurecimento artístico e profundidade de temas.

Artur Gomes - Além da poesia em verso, já exercitou ou exercita outra forma de linguagem com poesia?

Marcelo Mourão - Sim, exercitei. O Máquina mundi tinha poemas de todos os tipos, das mais variadas formas fixas e não-fixas. Nele, coloquei sonetos tradicionais, sonetos pós-modernos, cordel, redondilha maior, redondilha menor, vários haicais, versos livres, versos brancos, mas também pus poemas visuais, figurativos, concretos e até dadaístas só com imagens. A proposta dessa obra era justamente ser aquilo que o saudoso mestre Pedro Lyra definiu tão bem em sua crítica ao livro: “um imenso sincretismo pós-moderno”. Tinha de tudo ali. Em breve, quero experimentar fazer vídeopoemas e poesia sonora.

Artur Gomes - Qual poema escreveu quando teve uma pedra no meio do caminho?

Marcelo Mourão - Nossa... Muitos. Inclusive alguns que trabalhavam justamente a metáfora da pedra, mesmo sem ser a do caminho, consagrada por Drummond. Não sei citar um só... Talvez o “Língua de fora”, que é do meu primeiro livro, “O diário do camaleão”.

Artur Gomes - Revisitando Quintana: você acha que depois dessa crise virótica pandêmica, quem passará e quem passarinho?

Marcelo Mourão - Posso dizer que muitos passarão e tantos outros passarinho. Os fascistas, os pseudo-poetas, os pseudo-artistas, os políticos sem nenhum lume, os homens e mulheres de pouquíssima sabedoria e valor, enfim, esses e muitos e muitos outros passarão batidos. Os de grande valor, seja em qual área for, como sempre, são os que irão ficar, os que irão voar, como passarinhos, rumo à eternidade, à glória, à permanência, que paira acima do tempo.

Artur Gomes - Escrevendo sobre o livro Pátria A(r)mada, o poeta e jornalista Ademir Assunção, afirma que cada poeta tem a sua tribo, de onde ele traz as suas referências. Você de onde vem, qual é a sua tribo?

Marcelo Mourão -  A minha tribo é a dos poetas que cantam o social, o político e os sentimentos também. Adoro amalgamar poesia com história, sociologia, filosofia, antropologia e psicologia. Minha tribo é a dos poetas que leem compulsivamente e escrevem com muita dedicação e amor. Eu sou, por formação, professor de História, de Língua Portuguesa e de Literatura, então essas bases teóricas explicam praticamente tudo sobre a minha escrita e o meu ativismo político-poético.

Artur Gomes - Nos dias atuais o que é ser um poeta, militante de poesia?

Marcelo Mourão - Não gosto do termo “militante” para definir um artista. O poeta Karlos Chapul  certa vez escreveu: “Não milito. Militar me limita”. Esses versos resumem bem o que penso. Prefiro a palavra “ativista”. Eu me mantenho ativo ativando consciências, chamando a atenção dessas mesmas consciências para os encantos da “Senhorita Poesia”. Sigo incansavelmente ativando alguns botões na alma de quem me ouve ou lê e aí sim nasce no leitor/espectador a paixão pelo texto. Militar não. Militar me lembra muito a ideia do proselitismo, da pregação para tentar trazer adeptos para o nosso lado, lutar para convencer as pessoas que a poesia (e a arte em geral) é uma ambrosia a ser saboreada. Não quero convencer nem impor nada a ninguém. A arte encanta ou não.

Não preciso me esforçar para que ela conquiste adeptos ou ganhe espaços, ela faz isso por si mesma. Não sou um soldado dela, a serviço dela, obediente a ela. Ela, em alguns poemas meus, é descrita como uma namorada, uma amante, uma senhorita, uma mulher.  Será que forçar uma mulher a querer você é correto? Claro que não, né? Tem que surgir naturalmente a emoção que te prende a ela. Então, sou muito implicante com a expressão “militante de poesia”. Não milito, não. Militar me limitaria e limitaria a poesia também. Ser um ativista de arte e cultura (e aí a poesia está nesse contexto incluída) é aquilo que descrevi ali em cima. É nisso em que acredito.

Artur Gomes - Que pergunta não fiz que você gostaria de responder?

Marcelo Mourão - Se, além de poeta, eu trabalho com outros gêneros literários?

Resposta - E eu te respondo: Sim. Já escrevi 5 livros de crítica literária (só dois, até agora, foram publicados) e um romance (ainda no prelo). Em breve, vou começar a me dedicar a lançar biografias de poetas e de grupos e movimentos poéticos, todos estes dos anos 1980, daqui do Rio de Janeiro, que são objetos do meu campo de pesquisa no mestrado e no doutorado, que é a Poesia Verbalista Urbana carioca e oitentista.


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5 comentários:

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  2. Artur, querido meu, muito agradecido por essa oportunidade de me expressar, dada mais uma vez por você. Sou muito grato. Um abração!

    Marcelo Mourão

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  3. Excelente entrevista. Perguntas instigantes e respostas impactantes. Parabéns a ambos!

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  4. Marcelo Mourão é dos grandes poetas contemporâneos, um estudioso de poesia, um ativista cultural que orgulha o Rio de Janeiro. Jovem, com um caminho inteiro a sua frente, já tem lastro da melhor poesia que se faz, atualmente, no Brasil. Sua entrevista é honesta e, mesmo, impactante, por expor, verdadeira e corajosamente, suas ideias sobre o que entende do fazer poético. Orgulho de sua amizade. Parabéns!

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