Ana Campos – Curitibana, 38
anos, autora dos livros: O Cortiço da Poeta (coletânea de poesias) e Uma
História de Amor Nada Romântica (romance cômico). Fundadora e editora da
Revista Virtual Curitiba Suburbana.
Artur
Gomes - Como se processa o
seu estado de poesia?
Anna
Campos - Tudo depende do meu estado de espírito e do estado do meu
mundo físico também. Não consigo fazer poesia, por exemplo, se estiver com
problemas concretos do dia a dia, que sejam graves. Minha emoção é um tanto
masculina, só consigo me concentrar em um sentimento de cada vez e se o
sentimento que me toma é do tipo grotesco, como preocupação financeira ou
familiar, jamais posso escrever um poema.
Por outro lado se o problema for no
campo psico-filosófico-emocional, acho que isso me ajuda a escrever. Talvez eu seja
um tanto masoquista nesse sentido, pois quanto maior a dor (ou o prazer)
psicológica/emocional, mais inspiração me sobrevêm para a escrita. A apatia
também me bloqueia, quando tudo fica estável demais, estático demais, também não consigo escrever. Já no sentido programático da pergunta, não
tenho nenhuma regra, a ideia vem, ou a vontade de escrever vem e eu escrevo, a
qualquer hora, sem rituais.
Artur
Gomes - Seu poema preferido?
Anna Campos - Há muitos, mas se tiver que eleger um
preferido, Poema Em Linha Reta, de Fernando Pessoa.
Artur
Gomes - Qual o seu poeta de cabeceira?
Anna
Campos - Redundando: Fernando Pessoa.
Artur Gomes - Em seu
instante de criação existe alguma pedra de toque, algo que o impulsione para
escrever?
Anna
Campos - Convicção. Quando escrevo sobre algo de que tenho convicção, a
inspiração flui de forma mais intensa. Por isso prefiro escrever mediante
inspiração, nunca me dei bem com a poesia do tipo profissional. Eu não poderia
fazer poesia sobre temas predefinidos e menos ainda sobre idéias das quais eu
não compartilho, a menos que fosse pra dizer o contrário.
Artur
Gomes - Livro que considera definitivo em sua obra?
Anna Campos - Não compreendi
bem a pergunta, mas se fala de uma maneira geral: O HOMEM MEDÍOCRE de José
Engenieros. Um livro que foi importante no processo da minha auto-descoberta
enquanto poeta, embora não seja do gênero. Mas se diz entre os livros de
poesia, creio que, Poemas Escolhidos, de Gregório de Matos.
Artur
Gomes - Além da poesia em verso, já exercitou ou exercita outra
forma de linguagem com poesia?
Anna
Campos - Sim, já escrevi alguns contos rimados. Sei que é uma incoerência, mas
gosto de misturar as ideias. Também desenho e pinto e acho que é mais uma forma
de poesia.
Artur Gomes - Qual
poema escrevei quando teve uma pedra no meio do caminho?
Anna Campos - Essa pergunta é
boa! Escrevi muitos, quando de muitas pedras, mas para responder vou dar um
exemplo das mais antigas:
Ousar Sempre
Estou no fronte, com o coração na mão.
Não é o medo da morte que me faz temer,
mas o receio da vida depois da devastação.
Estou no porto vigiando o mar,
esperando nascer no horizonte
o barco que me faz aguardar.
Estou flutuando nas águas mansas do silêncio
que precede o grito da alma,
mas, contudo, estou calma,
pois em meus olhos escondo
dores maiores vividas
e dos labirintos do mundo
conheço bem as saídas.
Não sou a verdade serena
que resiste ao penhor da mentira,
nem tenho um peito de aço
que vença a ponta da lança,
mas deixo minh’alma disforme
deter-se em qualquer fantasia
porque viver sem amor
é sepultar-se no próprio esconderijo.
Artur Gomes - Revisitando Quintana: você acha
que depois dessa crise virótica pandêmica, quem passará e quem passarinho?
Anna
Campos - Eles passarão, os poetas, passarinho. rs
Artur
Gomes - Escrevendo sobre o livro Pátria A(r)mada, o poeta e
jornalista Ademir Assunção, afirma que cada poeta tem a sua tribo, de onde ele
traz as suas referências. Você de onde vem, qual é a sua tribo?
Anna
Campos - Não sei, não sei se concordo. A menos que exista
a tribo dos avulsos, na qual eu poderia me encaixar. Veja, não tive uma
formação de referência. Comecei a escrever poesia aos 11 anos de idade, depois
de ler um único livro de Castro Alves. Sou de origem muito humilde, cresci em
uma favela cercada por pessoas semi-analfabetas, onde a ocupação cotidiana era
a sobrevivência e nada mais. Estudei até a antiga quarta série do ensino fundamental
e larguei a escola, comecei a trabalhar, mas nunca deixei de escrever os meus
poemas, que de nada serviam a não ser para ir para lixo algumas semanas depois.
Nesse tempo, lia um ou outro livro de poesia que
pegava, às vezes, em bibliotecas públicas. Retomei os estudos aos 26 anos, já
grávida do meu terceiro filho. Só então concluí o ensino médio e entrei na
faculdade e só então passei a ter mais contato com a literatura. De lá pra cá
venho conhecendo autores consagrados e contemporâneos, mas nunca mudei minha
linha estilística de escrita e nunca mensurei a qual ela possa se enquadrar,
caso exista alguma semelhança é mera coincidência.
Até hoje não tenho certeza se o que escrevo é
poesia, pois nunca fui abonada por quem tenha alçada para tanto, eu só escrevo
e ponto. Também nunca participei de nenhum tipo de movimento ou coisa parecida,
então, não sei se faço parte de alguma tribo.
Artur Gomes - Nos dias atuais o que é ser um
poeta, militante de poesia?
Anna
Campos - Bem, eu poderia te dar várias respostas fofas
e/ou filosóficas, mas para mim, a verdade é que ser poeta nos dias de hoje, é
ser aquela figura antiquada, fora de moda, fora da casinha para a grande
maioria. E também é ser aquele que luta contra o processo de desencanto da
humanidade, aquele que insiste em manter a magia das coisas e da vida, mas luta
praticamente sozinho. Ser poeta hoje em dia é como ser aquela peça de museu que
ainda vive e anda por aí tentando se modernizar tornar-se vintage e ganhar
espaço em uma realidade completamente avessa à poesia. Ser poeta nos dias de
hoje é ser louco, é ser diferente, o que é bom para alguns, mas é um pé no saco
para todos os outros.
Artur Gomes - Que pergunta não fiz que você
gostaria de responder?
Anna
Campos - Sem mais perguntas ou resposta. Quero apenas
agradecer a oportunidade.
Valeu, querido!
Anna é poesia!
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