Conheci o Luís Lúsio,
há pouco, ele me adicionou no face para que eu lhe passasse algumas impressões
sobre o Karlos Chapul, que conheço
lá dos anos 80, quando dos tempos de Mostra
Visual de Poesia Brasileira e
dos agitos em encontros criados pelo saudoso e desaparecido Gabriel de La Puente, em
Jardinópolis, Batatais e Registro, 3 cidades paulistas que continuam cravadas
em minha memória. Nesse bate papo que
segue posso dizer que conheço o Luís
Lúsio mais um pouco, e o contato diário por aqui irá enriquecer muito mais a
nossa troca poética e as nossa impressões sobre o tempo em que vivemos.
Luís
Lúsio - Poeta nascido na Baixada Fluminense, também se desdobra
como professor e jornalista. Atualmente escreve a biografia de Karlos Chapul.
Artur
Gomes - Como se processa o seu estado de poesia?
Luís Lúsio - Penso
que o meu estado de poesia ainda está se processando. Ele não é algo
definitivo, e se em algum momento for, ficarei preocupado, pensarei que terei
morrido. A todo momento busco alternar, a fim de encontrar um estilo. Tento
várias fórmulas, mesclar concretismo, com o minimalismo típico dos tempos
atuais. Alguns, têm certo apelo visual – o que me interessa bastante.
Às vezes, meu poema se
dá em uma só palavra, toda ela dissecada. Cada palavra é uma história. Alguns deveriam
ser ilustrados para consumo, daí um apelo que a minha arte faz às artes plásticas.
Mas, ultimamente, ando escrevendo sonetos, diria que eles são anárquicos,
porque não respeitam o padrão original dos sonetos.
Artur
Gomes - Seu poema preferido? Próprio. Ou de outro poeta de sua
admiração.
Luís
Lúsio - nunca saberei como é por dentro das coisas,
o tamanho específico do coração e quais diferenças há no teu
em relação ao meu.
nunca saberei a história do objeto;
quem o construiu, o porquê da construção, o quê do arquiteto
que há no filho.
nunca saberei como sentem, pensam, viajam, sintetizam, de
fato, sobre qualquer concretude ou abstração,
palavras nos aproximam repelindo os apressados...
toda a nossa dificuldade em entender,
através do morfema, o que o nosso arregalar de olhos disse
além...
a surpresa em destilar tanto do vazio.
nunca saberei o porquê de estar aqui no banheiro cedo
sentado olhando outros seres brincando.
nunca saberei porque os insetos alisam as patas, que mais
parecem linhas, antes de tomar atitude,
nunca saberei por qual motivo continuo escrevendo e
planejando e nunca conseguindo cumprir os prazos
sabendo que as dúvidas movem os moinhos do planeta que não
sabe,
sabendo que a foto capta tão pouco da nebulosidade climática
do fato.
Luís Lúsio.
Artur
Gomes - Qual o seu poeta de cabeceira?
Luis
Lúsio - Hoje, dois. Karlos
Chapul e Rumi.
Artur
Gomes - Em seu instante de criação existe alguma pedra de toque,
algo que o impulsione para escrever?
Luís
Lúsio - A realidade serve de inspiração. A decadência de tudo, do
ser humano, da sociedade e da poesia é uma fonte. Engraçado, que em alguns
poemas perco horas mexendo e remexendo e outros são meros insights, estalos do
inconsciente, os recebo sem um método específico, e não consigo explicar muito
bem por que vieram. Difícil definir uma vertente de recebimento, são várias entradas.
Alguns vêm de coisas que vivi e quis registrar para não esquecer, outros são devaneios
que quis desenrolar, outros são frutos de alguma pesquisa que achei legal, um
fato inusitado.
Artur
Gomes - Livro que considera definitivo em sua obra?
Luís
Lúsio - Fernando Pessoa é um poeta que ainda não superei. Poesia
completa de Álvaro de Campos e Alberto Caeiro. Foram os primeiros poetas que
realmente me deixaram chocado.
Artur
Gomes - Além da poesia em verso já exercitou ou exercita outra
forma de linguagem com poesia?
Luís
Lúsio - Também escrevo ensaios filosóficos e prosas poéticas.
Para mim, a poesia está muito próxima da filosofia,as trago para o mesmo
espectro, até por causa do sentido original do termo grego “Sofia”. Uma sendo mais metafórica e a outra mais metonímica. Sinto
uma liberdade enorme em ser um prosador do cotidiano. A poesia é uma arte com
uma aura diferente, mas a vida é prosa com alguns flashes de poesia.
Artur
Gomes - Qual poema escreveu quando teve uma pedra no meio do
caminho?
Luís
Lúsio - Toda ilusão é uma desfeita,
Em crise, o excesso de sentido,
Se confunde, talvez a poesia,
Fico com as pessoas comuns, quaisquer,
Nenhum nome é verdade,
Crítico pelo menos não está armado,
Google me responde,
Eu estou num outro tempo,
Qual é a saída? - eu pergunto,
Em busca de recompensa ou para evitar.
Luís Lúsio
Artur
Gomes - Revisitando Quintana: você acha que depois dessa crise
virótica pandêmica, quem passará e quem passarinho?
Luís
Lúsio - O isolamento tem muito a nos ensinar. A mim não foi tão
doloroso porque me acostumei com a solidão, ela é sólida e o silêncio ensina muito
sobre si. E é isto o que devemos procurar: o autoconhecimento. Fica difícil
fazer previsões, nunca estivemos tão conectados, mas ao mesmo tempo parece que
não fazemos jus a tal conexão.
Os problemas da
humanidade são os mesmos desde a Antiguidade: falta de amor e respeito ao
próximo. Nada é por acaso e é na crise que precisamos criar a criatividade para
sairmos mais fortes do que antes. Cientistas precisam ser mais incentivados e
são nossos verdadeiros heróis.
Só o Estado pode intervir de uma maneira eficaz e financeira
para solucionar os problemas atuais. Porém, vivemos em um Estado de exceção que
flerta com o autoritarismo. Então, é a hora dos bons políticos se destacarem.
Eles existem. Os bons políticos, os cientistas e os artistas, que retratarão o
momento, são os passarinhos e o fascismo passará.
Artur
Gomes - Escrevendo sobre o livro Pátria A(r)mada, o poeta e
jornalista Ademir Assunção, afirma
que cada poeta tem a sua tribo, de onde ele traz as suas referências. Você de
onde vem, qual é a sua tribo?
Luís
Lúsio - Lá em 2013, na faculdade de letras da UFRJ, encontrei um
grupo apelidado de “Amíster”, formado
por pessoas muito engajadas, tanto
politicamente, quanto poeticamente. Nos reuníamos no gramado da faculdade para
trocar experiências, produzíamos diversos saraus, era muito bom. Existe um
grupo chamado Mural de Poesia/Letras
– UFRJ, no Facebook, onde nossas agitações poéticas, conseguiram expandir
bastante as publicações e os membros. Entre 2013 e 2016, houve um pico de interesse
no grupo. De 400 membros, o grupo foi para mais de 1000. Quase todos os nossos
colegas se experimentavam ali.
Artur
Gomes - Nos dias atuais o que é ser um poeta, militante de
poesia?
Luís
Lúsio - No dia em que a poesia tiver alguma pretensão de
militância, deixará de ser poesia e virará política. Portanto, prefiro ela
despretensiosa, livre de estereótipos e paradigmas. Contudo, compreendo que a
sociedade precisa do viés poético produzido em larga escala para revolucionar
sua política, e respeito muito quem está na linha de frente para promover o encontro
entre os poetas.
Ser poeta hoje é entender que o mundo precisa de mudanças e é
trazendo arte ao mundo individual, tratando a própria vida como uma obra de
arte, é que se alcança uma espécie de plenitude, que a sociedade tanto precisa.
Todos são poetas, artistas, basta que se descubram. Essa busca que é o
verdadeiro desafio.
Artur
Gomes - Que pergunta não fiz que você gostaria de responder?
Luís
Lúsio - Qual o último poema que você escreveu? Então, lá vai:
Pindorama
Belo pandemônio meridional,
Gente de cá e de lá a detratar,
Pecaminosa gleba fértil onde,
Bafejam juízes-empresários,
Enrolada ralé da égide pede,
E o fato escancarando a tela,
Prefere ir pastar com pastor,
Se tosse, xamã, pajé, aí, UTI,
Se fosse, não seria o que é,
Berço do conto de nunca ser,
Corisco arrisca caçoar teu ar,
Bebê aluado meio sem jeito,
Bebe o que pinga de manhã.
A outra face do poeta: me identifico muito com o Chapul,
quem estudo hoje, na timidez. O caminho do haikai ensina a humildade como
ninguém. Tenho em mim a desnecessidade de me sentir importante. Sou o
des-sabedor das coisas. Sabe o menino que carrega água na peneira, do Manoel de Barros? Pessoas lêem o poema
e pensam em mim. O poeta carrega uma aura muito pesada, inclusive, a palavra
carrega um moralismo a qual me oponho.
Mais jovem já tive pretensão de liderar poetas, publicar
manifestos. Pensava, 2022 está na porta, 100 anos da Semana de Arte Moderna.
Mas quando política se misturava com poesia, senti alguma contaminação nas
minhas ações e resolvi recuar. Por quê
não publicar um livro? - pensei. Pra quê? A quem estou atendendo? Um desejo do
ego? Ou de um simples pragmatismo?
Sempre fui contra o fazer por fazer. Estamos em eterna
experimentação, então preciso abusar dela, antes de querer que a palavra ecoe
na eternidade. Publicar é uma eterna responsabilidade. Hoje, aos 28 anos, tenho
necessidade de aprender a ler, primeiro, para assim poder ajudar meus
camaradas.
Deixei para amanhã o poema que deveria fazer hoje. Não por
covardia, mas por entender a responsabilidade do poeta na polis. Estamos
falando de criação, estamos falando de aproximação com Deus. Não pode ser
qualquer coisa. A filosofia me ensinou que o niilismo é um grande amigo, pois é
ele quem vai ensinar o valor do valor.
Sempre fui um peixe fora d'água em alguns encontros de
poetas aqui do Rio de Janeiro, é muito ego envolvido. Então, aprendi a deixar o
meu ego mais em off. Assim, atrapalho menos. Como um bom budha, fui viver a
retidão do Sana, de Lumiar. Como se fosse um eremita e ainda sufista.
O verdadeiro amor está bem a frente das agronomias inversas
da paixão. Minha natureza é muito desequilibrante, logo precisei aprender a
neutralizar esse lado. Por questões evolutivas mesmo.
Não me considero um anti-cosmopolita porque é da cidade que
eu sobrevivo. Mas dou aulas de inglês muito mais para ajudar o desenvolvimento
espiritual dos alunos do que para elitizá-los. As matérias que produzo no
jornalismo são muito mais de cunho alternativo, visando um olhar crítico da
sociedade do que as habituais hard news a que estamos acostumados e são sempre
as mesmas.
Luís
Lúsio
Fulinaíma
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