Meu primeiro contato com Carmen Moreno se deu lá pelos idos
dos anos 80, numa noite de Poesia no Rio de Janeiro, fui apresentado a ela pelo
seu irmão meu querido amigo poeta Tanussi
Cardoso. No Rio, voltamos a nos
encontra várias vezes, em muitos outros Saraus, como no Terça ConVerso, produzido pelo grupo Poesia Simplesmente, no Teatro Gláucio Gil, em Copacabana.
Em 2014, voltamos a
nos encontrar em Bento Gonçalves, nas edições do Congresso Brasileiro de Poesia, edição em que o poeta homenageado foi Tanussi Cardoso.
Carmen Moreno - escritora e professora carioca, recebeu prêmios em diversos gêneros
literários. Membro titular do PEN Clube do Brasil, Carmen é contista,
romancista, poeta e dramaturga. Concluiu os cursos de Bacharelado em Artes
Cênicas e Licenciatura em Educação Artística, ambos pela Universidade Federal
do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO). Leciona na área de sua formação, desde
1995, em escolas da Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro (SME). Trabalhou
para o Programa Nacional de Incentivo à Leitura (PROLER), utilizando o teatro
como ferramenta. Biblioteca Nacional (1995).
Publicou: Diário de Luas (romance), Rio de Janeiro: Rocco, 1995, finalista da 5ª Bienal Nestlé de Literatura Brasileira; Sutilezas do Grito (contos), Rocco, 1996; O Primeiro Crime (romance policial), Rocco, 2003. O livro lançou a Coleção Elas São de Morte, Denise Assis (Org.), juntamente com Uma Aula de Matar, de Ana Arruda Callado, e O Jantar da Lagartixa, de Ateneia Feijó; O Estranho (contos), Rio de Janeiro: Five Star, 2006. Dentre os três contos premiados, publicados no livro, “Dora” foi adaptado para o cinema e participou do Festival Internacional de Gramado 2009, finalizando a Mostra de Curtas Gaúchos, como média-metragem convidado; De Cama e Cortes (poesia), Rio de Janeiro: UERJ, 1993; Loja de Amores Usados (poesia), Rio de Janeiro: Multifoco, 2010, e Para Fabricar Asas (poesia), Rio de Janeiro: Ibis Libris Editora, 2015.
Integra mais de 30 coletâneas, dentre elas: Antologia da Nova Poesia Brasileira,
Olga Savary (Org.), Hipocampo; Mais 30 Mulheres que
Estão Fazendo a Nova Literatura Brasileira (contos), Luiz Ruffato (Org.), Record; Mulheres
(in) Versos (poesia), São Paulo: Massao
Ohno Editor, 1990.
A obra acima foi resultado do evento homônimo, sob curadoria
de Carmen Moreno e da jornalista Helena Rocha, que reuniu, (no Bar Botanic, no
Rio), poetas, atores e músicos. O objetivo: expressar o universo feminino
através da poesia. Participaram: Glória Perez, Ana Miranda, Elisa Lucinda,
Geraldo Carneiro, Leila Pinheiro, Moacyr Félix, Olga Savary, Leila Míccolis,
Bráulio Tavares, Tanussi Cardoso, Mano Melo, Marly de Oliveira, Cássia Kiss,
entre outros artistas. O evento inseria-se no projeto Ana Magnani, coordenado
por Maria Helena Kühner – apoio: Instituto Italiano de Cultura.
Algumas referências e estudos sobre sua obra: o romance Diário de Luas foi
tema da dissertação de Mestrado de Lilian Gonçalves de Andrade: Diário de Luas:
um Künstlerroman no universo literário de Carmen Moreno. Orientadora: Profª.
Drª. Eliane Terezinha do Amaral Campello - Universidade Federal do Rio Grande
(FURG-RS); Quem Conta um Conto: estudos sobre Contistas Brasileiras Estreantes
nos anos 90 e 2000. Helena Parente Cunha (Org.). Rio de Janeiro: Tempo
Brasileiro, 2008; Enciclopédia da Literatura Brasileira. Afrânio Coutinho e J.
Galante de Sousa, sob a coordenação de Graça Coutinho e Rita Moutinho. 2 ed.
aum. São Paulo: Ministério da Cultura (MINC), Biblioteca Nacional e DNL
Editora, 2001, v.2.
Entre as premiações, destacam-se: Prêmio Casa da América Latina (Concurso de Contos Guimarães Rosa 2003), Rádio França Internacional, Paris; Prêmio de Desenvolvimento de Roteiros Cinematográficos de Longa-metragem (1ª fase: Argumento): criação do roteiro A Delicadeza das Facas. Ministério da Cultura (MINC) / Secretaria do Audiovisual, 2001; Bolsa de Incentivo ao Escritor Brasileiro (poesia), Ministério da Cultura/ Biblioteca Nacional (MINC/BN),1994; Prêmio Orgulho Carioca (categoria Professora-Escritora), Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro / Secretaria Municipal de Educação, 1999, e Concurso Literário Stanislaw Ponte Preta (dramaturgia). Menção Honrosa, com o texto A Erosão de Eros (publicado em antologia), Rio de Janeiro: Rio Arte, 1996. O texto integrou diversos ciclos de leituras, e foi encenado três vezes, a partir de 2004.
Carmen Moreno participa, desde 1983, de saraus e eventos literários, em diversos
espaços culturais do país, sobretudo da cidade do Rio de Janeiro. Integra o
coletivo feminista Mulherio das Letras, que reúne mais de 7.000 escritoras e
mulheres cujas atividades profissionais estão ligadas ao livro e sua produção.
Artur
Gomes - Como se processa o seu estado de poesia?
Carmen
Moreno - Estar viva é experimentar um estado permanente de poesia.
Viva, na plenitude da palavra - que envolve alegria e dor, e a complexidade
indizível dessas experiências. Sou, por natureza, uma observadora detalhista do
mundo, das pessoas, de mim mesma. O poema surge, em algum momento, desse estado.
E quase sempre é gerado por uma emoção intensa, ou uma inquietação incontrolável, que
mobiliza minha imaginação e se materializa no verso.
Artur
Gomes - Seu poema preferido? Próprio. Ou de outro poeta de sua
admiração.
Carmen
Moreno - Teria dificuldade para escolher um poema preferido, meu
ou de outro poeta. São muitos poemas especiais. Vou eleger um inédito, que
escrevi para expressar minha angústia diante desta pandemia:
O
VÍRUS
São dias sombrios estes de
guerra.
Tranco-me na casa, cárcere,
quarentena:
O inimigo tomba-me pelo abraço.
As mãos são mísseis, todo toque
um temor.
Espreito da janela os suspeitos
que passam mascarados.
O poder, desmascarado:
O pequeno se agiganta, toma as
rédeas, dá as cartas.
O gênio humano curva-se à
destreza invisível do invasor.
São dias sombrios estes de
terror.
Não há lado neste front.
Os vip’s não têm bunker, nem escolhem suas macas.
Áfricas distantes e seus Ebolas
são,
num salto, meu quarto e
continente.
Itália, Espanha, Leblon,
Paracambi.
A China é aqui.
Um Planeta sem fronteiras:
igualdade compulsória.
Nem Cristo alcançou tamanha
glória.
Na pirâmide social da dor,
hospitais e seus corredores de
óbito são notados:
do topo à base, enfim, os
homens irmanados!
Carmen
Moreno
Artur
Gomes - Qual o seu poeta de cabeceira?
Carmen
Moreno - Meus livros de cabeceira variam muito, mas escolho três
poetas que me emocionam demais. Comecei a ler os poemas do meu irmão, Tanussi
Cardoso, aos oito anos de idade, com grande espanto e admiração. Adoro, entre
tantos outros, Mia Couto e Cecília Meireles.
Artur
Gomes - Em seu instante de criação existe alguma pedra de toque,
algo que o impulsione para escrever?
Carmen
Moreno - Sentimentos fortes. Normalmente de indignação, medo,
angústia, tristeza, ou alguma reflexão existencial. E ao burilar os versos,
exaustivamente, descubro, aos poucos, o que estava encoberto. Na verdade, quando
escrevo, prosa ou poesia, o que me interessa é o mundo interior. Jamais seria
escritora se não pudesse abordar a complexidade dos sentimentos humanos. Lanço
meu olhar sobre o que se move,
mas minha pretensão é sempre o invisível, o impalpável. O invisível é o que me
apaixona.
Artur
Gomes - Livro que considera definitivo em sua obra?
Carmen Moreno - Não tenho um livro que possa chamar de definitivo, pois esta palavra me remete a algo morto; mas todos os meus livros revelam minha paixão e o meu respeito pela literatura. Entre minhas obras publicadas, destaco Para Fabricar Asas, poesia (Ibis Libris Editora), e Sutilezas do Grito, contos (Rocco). Contudo, as inéditas refletem um amadurecimento ainda maior da minha escritura. Destaco os livros A Casa da Louca (autoficção), cujo título faz uma referência ao maravilhoso A Louca da Casa, de Rosa Montero; e Sobre O Amor e Outras Traições (poesia), que será publicado pela Editora Patuá. Para minha felicidade e honra, a obra acolhe seções com belos textos de Antonio Carlos Secchin, Cecilia Costa, Constância Lima Duarte e Tanussi Cardoso.
Carmen Moreno - Não tenho um livro que possa chamar de definitivo, pois esta palavra me remete a algo morto; mas todos os meus livros revelam minha paixão e o meu respeito pela literatura. Entre minhas obras publicadas, destaco Para Fabricar Asas, poesia (Ibis Libris Editora), e Sutilezas do Grito, contos (Rocco). Contudo, as inéditas refletem um amadurecimento ainda maior da minha escritura. Destaco os livros A Casa da Louca (autoficção), cujo título faz uma referência ao maravilhoso A Louca da Casa, de Rosa Montero; e Sobre O Amor e Outras Traições (poesia), que será publicado pela Editora Patuá. Para minha felicidade e honra, a obra acolhe seções com belos textos de Antonio Carlos Secchin, Cecilia Costa, Constância Lima Duarte e Tanussi Cardoso.
Artur
Gomes - Além da poesia em verso já exercitou ou exercita outra
forma de linguagem com poesia?
Carmen
Moreno - A narrativa dos meus contos e romances é impregnada de
poesia. Sou professora de teatro, tenho alguma experiência com vídeos, e todas
essas linguagens refletem o meu olhar de poeta. A poesia é minha base de
respiração.
Artur
Gomes - Qual poema escreveu quando teve uma pedra no meio do
caminho?
Carmen Moreno - A maioria. Para escrever, preciso de pedras no meu caminho. A obra
nasce para me ajudar a transpor minhas pedras. Escolho, como exemplo:
PARACAMBI
A irmã nunca morre.
Feito o poema e seu gemido
calado,
à espreita de um verbo
salvador.
A irmã, poema enclausurado.
Nenhum divã soletrou em mim,
traduziu por mim o poema
loucura.
Leio em braile a dor da irmã,
ao esfregar o peito nos dias
sem paz.
Sou sua asma e asfixia,
doçura e taquicardia.
A irmã nunca morre.
Um tropeço desenterra a dor
vivaz (vitalícia).
A irmã e sua camisa de força.
O pai possível, a juventude
impossível,
os sonâmbulos do pátio a pedir
cigarros
nos dias de visita,
a sedação dos doutores... esses
senhores!
A irmã e o Dr. Eiras, seu
preço:
seu lar, masmorra... endereço.
Carmen
Moreno
Artur
Gomes - Revisitando Quintana: você acha que depois dessa crise
virótica pandêmica, quem passará e quem passarinho?
Carmen
Moreno - Passarão todos os que não aproveitarem a pandemia para
revisitar seus valores éticos, suas ações individualistas, seu egoísmo, sua
indiferença com relação à destruição do planeta, à fome e ao seu semelhante. Passarão
os fascistas e os fomentadores da mentira e do ódio. Os passarinhos serão
sempre aqueles que alimentam um Quintana no peito.
Artur
Gomes - Escrevendo sobre o livro Pátria A(r)mada, o poeta e
jornalista Ademir Assunção, afirma que cada poeta tem a sua tribo, de onde ele
traz as suas referências. Você de onde vem, qual é a sua tribo¿
Carmen
Moreno - Acabo de me lembrar de “Minha tribo sou eu”, uma
música do Zeca Baleiro. Fui influenciada pela poesia independente - os poetas
marginais, pela MPB de 1970, pelos poetas que atuaram comigo nos recitais das décadas
de 80 e 90, pelos autores clássicos, pela prosa, pelo teatro (minha formação
acadêmica), mas nunca me senti vinculada a nenhuma tribo.
Artur
Gomes - Nos dias atuais o que é ser um poeta, militante de
poesia?
Carmen
Moreno - Participar de eventos e expressar sua voz, escrever,
publicar (lutar para ser publicado), apoiar os seus pares com generosidade,
incentivar a leitura, produzir poesia de qualidade, que proporcione algum nível
de desarrumação emocional e intelectual, algum impacto reflexivo no leitor ou
ouvinte, na sociedade são formas de militância.
Artur
Gomes - Que pergunta não fiz que você gostaria de responder?
Carmen
Moreno - Nenhuma me ocorre.
Adorei participar. Muito obrigada pelo convite e parabéns
pelo projeto.
FulinaímaMultiProjetos
portalfulinaima@gmail.com
(22)99815-1268 - whatsapp
Que bom ouvir Carmen Moreno, uma das grandes poetas brasileiras. Parabéns pela sua inteligência e sensibilidade.
ResponderExcluirObrigada, querido irmão e grande poeta. Bjs
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