Conheci Fernanda no
Sarau POLEM, em 2018, quando ainda
era realizado na Rua Mem de Sá na Lapa. Era noite de lançamento do meu Juras Secretas e naquela mesma noite
trocamos livros, e ganhei dela o seu Alta Voltagem.
Desde então, são bem numerosos os nossos encontrospelos Saraus nas noites do Rio, em sua maioria
no POLEM, onde ela é frequentadora assídua. Mas nos encontramos também uma vez
no Sarau Fio Cultural, organizado pela Clécia Oliveira, em Santa Teresa e na primeira edição
da Balbúrdia Poética em 2019 na La Taberna de Laura, onde ela fez uma das
performances mais emocionantes da noite.
Fernanda Luiza Kruse Villas Bôas nasceu em Recife, Pernambuco, no Brasil. Aos
cinco anos veio morar no Rio de Janeiro com sua família, partindo para
Washington D.C com a família por quatro anos durante sua adolescência. Lá
terminou o ensino médio e cursou um ano na Georgetown University. Fernanda tem
uma rica vida acadêmica. Professora de Inglês, Português e Literaturas, pela
UFRJ, Mestre em Literatura King´s College, University of London. É Mestre em
Comunicação pela UFRJ e Psicóloga pela Faculdade de Psicologia na Universidade
Santa Úrsula, com especialidade. Em Carl Gustav Jung em 1998. É escritora e
psicóloga junguiana e com esta escolha tornou-se uma amante profunda da arte
literária e da alma, psique humana.
Fernanda Villas Bôas tem vários livros
publicados, tais como: No Limiar da
Liberdade; Luz Própria; Análise Poética do Discurso de Orfeu; Agora eu era o Herói – Estudo dos Arquétipos junguianos no discurso simbólico de Chico
Buarque e A Fração Inatingivel;
é um fantasma de sua própria pessoa, buscando sempre suprir o desejo de ser
presente diante do sofrimento humano e às almas que a procuram. A literatura e
a psicologia analítica, caminham juntas. Preenchendo os espaços abertos da
ficção, Fernanda faz o caminho da
mente universal e daí reconstrói o caminho de volta, servindo e desenvolvendo à
sociedade o reflexo de suas próprias projeções.
Em Poesia publicou também os livros: Alma Lasciva , Alta Voltagem, Ave do Paraíso e No Coração da Loucura
Em Poesia publicou também os livros: Alma Lasciva , Alta Voltagem, Ave do Paraíso e No Coração da Loucura
Artur
Gomes - Como se processa o
seu estado de poesia?
Fernanda
Villas Bôas - O estado de poesia nasce subitamente através das
imagens inconscientes que pedem passagem
para se tornarem palavras. Não processo nada. Há uma vibração forte que
escancara as janelas do invisível, amplia o universo trazendo a ilusão da
divindade e me dando o poder da criação através das letras. Paixão, letra,
língua se unem em versos. Nunca faço rascunho, nem de mim mesma. As palavras
brotam a seu ritmo e gosto. Jorram e se
inventam desde o inconsciente. A poesia é a mais pura expressão do espírito. É
Luz. A poesia me faz viva.Uso a poesia como matéria prima para relatar minhas
impressões do mundo.
Artur
Gomes - Seu poema preferido? Próprio. Ou de outro poeta de sua
admiração.
Fernanda
Villas Bôas - São vários. Não tenho predileção por um
poeta. Diria que meus queridos lidos são: Fernando Pessoa, Jorge de Lima,
Carlos Drummond de Andrade, Paul Eluard, João Cabral de Melo Neto, Cora
Coralina, William Blake, entre outros e outras.
Artur
Gomes - Qual o seu poeta de cabeceira?
Fernanda
Villas Bôas - Não há um exato. Na vastidão da literatura,
escolho o poeta que está mais perto do meu sofrimento e do meu sonho naquele
tormento. Às vezes, eu mesma me escolho.
Artur
Gomes - Em seu instante de criação existe alguma pedra de toque,
algo que o impulsione para escrever?
Fernanda
Villas Bôas - A perda, o desespero, o abandono, o sexo.
Eros e Tânatos seriam primordiais. Os
poemas, construídos a partir de intenso exercício subjetivo, ganham mundo como
a dor de vários partos. Há suor, há lágrimas, há uivos lancinantes, há sangue
em metáforas de vida.
Artur
Gomes - Livro que considera
definitivo em sua obra?
FwenNS VillA Bôas - Alta
Voltagem (2017: Editora Chiado)
O Deleite
da Alma
Na menina dos seus olhos
Deito-me macia
Em suas pálpebras a fazer cócegas.
Solutio.
Em nossos silêncios molhados.
Artur
Gomes - Além da poesia em verso já exercitou ou exercita outra forma de
linguagem com poesia?
Fernanda
Villas Bôas - Sim. Muitas vezes, minha prosa vem em forma
de poesia.
Artur
Gomes - Qual poema escreveu quando teve uma pedra no meio do
caminho?
Fernanda
Villas Bôas
- Foram muitas pedras. Na busca de sentido, a poesia inventa expressões
próprias para interpretar esteticamente todos os conteúdos do inconsciente que
são muitas e variadas pedras no meio do caminho.
O
Medo e o Amém
Percebo gotas da morte
Pingarem aos poucos
Na minha cabeça
Me avisando
Que a hora está por
vir.
Resiste a poesia, sem responder exatamente a todas as perguntas que fazemos
sobre nossas infelicidades. Segue questionando até o fim. Apenas, tornando as
pedras, flores imaginárias, minimizando as perdas, as dores da alma para fazer
brilhar instantes mágicos de gozo e alegrias. Creio que todos meus poemas são
pedras que tirei do meu caminho.
Escrevia
nas mãos/ e sempre me disse/sou estranha/ escrevia e ria/ do nosso
desencontro/caíram tempestades.
( in No Coração da Loucura)
Artur
Gomes - Revisitando Quintana: você acha que depois dessa crise
virótica pandêmica, quem passará e quem passarinho?
Fernanda
Villas Bôas - Todos passarinhos. Voaremos no tempo e
movimento. Dialeticamente não há o mesmo rio. As águas jamais são as mesmas,
diz Heráclito.
Artur
Gomes - Escrevendo sobre o livro Pátria A(r)mada, o poeta e
jornalista Ademir Assunção, afirma
que cada poeta tem a sua tribo, de onde ele traz as suas referências. Você de onde vem, qual é
a sua tribo?
Fernanda Villas
Bôas - Consciente do saber e do sabor lúdico,
agridoce inebriante da palavra, poeta-arquiteta esgrimo com engenho à parte
frases bailarinas em construções desarmônicas e relação incestuosa com
significados distintos no contexto sem pertencer a uma tribo específica, mas
tendo meus primeiros passos na geração dos anos 70, com Carlos Henrique Escobar,
Claudio Leal Cacau entre os demais. Na época fui estudar Psicologia e fiz voo
solo por muito tempo.
E calada
A mente me avisa
Somente entre fardos
Entregues a você.
Todo o mundo
Na caixa de pandora.
Solta no mundo
Desatenta e pelo avesso
Atravesso somente este hiato
Em que todas as vozes me possuem
Artur
Gomes - Nos dias atuais o que é ser um poeta, militante de
poesia?
Fernanda
Villas Bôas - Um ser poeta é atualmente um ser que critica
o status quo do seu ponto de vista e sua forma de derrubar modelos enraizados
na tradição literária, como rima, figuras de linguagem, métrica em busca de uma
forma impactante e revolucionária. Não gosto da palavra militante na poesia,
uma vez que não milito nada. Transformo. Revoluciono a palavra feminina tão
submissa ao longo dos séculos
Artur
Gomes - Que pergunta não fiz que você gostaria de responder?
Fernanda
Villas Bôas - Nenhuma. Está completa a entre vista.
Sou a palavra impetuosa
E palavra que sente e canta, sussurra
As maravilhas da dor
Quando o coração bate ligeiro
No descompasso da fala.
( in Alta Voltagem)
Fulinaíma
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