Já citei Moacy
Cirne, várias vezes neste série de EntreVistas, e volto a fazê-lo, porque
difícil foram nossos encontro no Rio, que ele não se despedisse me dizendo: - "você precisa entrar em contato com o
Linaldo". - Passaram-se 30 e poucos anos e o contanto não havia
acontecido, até que, num comentário da entrevista com o Sérgio de Castro Pinto,
estava lá: Linaldo Guedes, daí não
perdi tempo, o adicionei e lhe enviei as indagações sobre o seu fazer poético.
E
eis que leio em suas respostas uma série de colocações, que vem de encontro a
muita coisa que penso, sobre essa arte tão complexa e profunda que é a poesia,
enquanto arte da palavra.
Linaldo Guedes é jornalista, poeta e editor. Nascido em
Cajazeiras (alto sertão da Paraíba), residiu durante 38 anos em João Pessoa,
onde atuou nos principais órgãos de comunicação da Paraíba e foi editor do
suplemento literário Correio das Artes
por seis anos. Em 2017, voltou a morar em Cajazeiras, onde criou, em parceria
com o poeta e jornalista Lenilson Oliveira, a Arribaçã Editora, já com 20 títulos publicados. Graduado em Letras,
é Mestre em Ciências da Religião, com pesquisa sobre as relações entre a poesia
de Augusto dos Anjos e o Budismo.
Como poeta, lançou os livros “Os zumbis também escutam
blues e outros poemas” (A União/Texto Arte Editora, 1998), “Intervalo Lírico” (Editora Dinâmica,
2005), “Metáforas para um duelo no Sertão” (Editora Patuá,
2012) e “Tara e outros Otimismos”
(Editora Patuá, 2016). Lançou, ainda, “Singular
e Plural na poesia de Augusto dos
Anjos” (Editora A União, 2000) e co-organizou os livros “Diálogos” (entrevistas com escritores
brasileiros publicadas no Correio das Artes- Editora Aboio/A União, 2004) e as
coletâneas de contos e poesia dos 50 anos do Correio das Artes (Editoras A União e Universitária/UFPB, 1999).
Lançou, em 2015, “Receitas de como se tornar um bom
escritor”, pela Chiado Editora, de Portugal.
Em 2018, lançou “O Nirvana do Eu: os diálogos entre a poesia de Augusto dos Anjos e a
doutrina budista”, “Padre Rolim em
quadrinhos” e “Não temos wi-fi”
(este em co-autoria).
Sua
produção literária e fortuna crítica podem ser acessadas nos seguintes blogues:
Linaldo é atualmente colunista no site Os Guedes.
Artur
Gomes - Como se processa o
seu estado de poesia?
Linaldo
Guedes –Meu estado de poesia vem muito das minhas leituras e muito
das minhas vivências nas ruas do mundo, da vida. E uma coisa à serviço da
outra. Ou seja: a linguagem à serviço da rua; a rua à serviço da poesia. Não
concebo literatura sem essa simbiose. Poesia com esmero na linguagem, mas sem a
voz das ruas, fica hermética, artificial e chata. E poesia com a voz da rua,
mas com desleixo na linguagem é apenas um ajuntamento de palavras.
Artur
Gomes - Seu poema preferido? Próprio. Ou de outro poeta de sua
admiração.
Linaldo
Guedes – Poema próprio tenho vários. Mas vou citar um que está em
meu primeiro livro, o poema
“Incômodo”:
“ser o anjo torto
da família
não tira meu sono
incomoda apenas
não ter asas para voar”
Poema dos outros, também tenho vários. Citaria dois, no
entanto: “Monólogo de uma sombra”,
de Augusto dos Anjos; e “Tabacaria”, de
Pessoa.
Artur
Gomes - Qual o seu poeta de cabeceira?
Linaldo
Guedes – Tenho vários, mas citaria, pela ordem, Carlos Drummond de
Andrade, Fernando Pessoa e João Cabral de Melo Neto. Mas o poeta que mais
pesquiso é Augusto dos Anjos.
Artur
Gomes - Em seu instante de criação existe alguma pedra de toque,
algo que o impulsione para escrever?
Linaldo
Guedes – Sim, mas não necessariamente, porque faço muitos poemas
sob encomenda, embora mesmo nesses o poema só saia após um insight que surge
aparentemente do nada. De qualquer forma, admito que tenho alguns momentos de epifania em que o poema já nasce
praticamente pronto, até em termos de linguagem. Citaria vários, entre eles “Carrossel de silêncio”, que fiz para
meu filho autista. Em outros, tenho que sofrer um bocado para concluí-lo.
Alguns passam anos e não consigo terminá-los.
Artur
Gomes - Livro que considera
definitivo em sua obra¿
Linaldo
Guedes – Minha obra tem uma sequência planejada. Após lançar meu
primeiro livro – Os zumbis também
escutam blues – já idealizei os demais. Por isso, todos são importantes,
porque um complementa o outro. Mas o que considero mais completo em termos de
conteúdo e linguagem é “Metáforas para
um duelo no sertão”, o terceiro de poemas.
Artur
Gomes - Além da poesia em verso já exercitou ou exercita outra forma de
linguagem com poesia¿
Linaldo
Guedes – Sim. Com mais três amigos, tive um grupo de poesias
intitulado Poecodebar, em João
Pessoa, no início dos anos 1990. Na época, a gente se apresentava em bares,
teatros e circuitos alternativos, recitando e encenando nossos poemas.
Também já tive um projeto chamado “LiterArte Musical”,
onde organizava saraus em homenagens a poetas vivos e mortos. Além disso, como
jornalista já editei suplementos literários e publiquei muitos autores
contemporâneos. Por fim, enquanto editor de livros, tenho, junto com meu sócio,
o poeta Lenilson Oliveira, publicado diversas obras poéticas.
Artur
Gomes - Qual poema escreveu quando teve uma pedra no meio do
caminho¿
Linaldo
Guedes – Ah, teve vários. Esse “Incômodo”, que inclusive dialoga com o gauche de Drummond, é um
deles. No meu primeiro livro tem muitos poemas escritos quando encontrei a tal
pedra. Foram poemas escritos no auge dos vinte e poucos anos, época de
rebeldia, em que a gente está sempre inconformado e querendo mudar o mundo.
Depois descobrimos que o mundo não muda, mas a gente sim.
Artur
Gomes - Revisitando Quintana: você acha que depois dessa crise
virótica pandêmica, quem passará e quem passarinho?
Linaldo
Guedes – Espero, mas não acredito nisso, que os políticos que não
se preocupam com o povo que os elegeram passem. Quem vai continuar passarinho
somos nós, poetas, artistas. E as crianças.
Artur
Gomes - Escrevendo sobre o livro Pátria A(r)mada, o poeta e
jornalista Ademir Assunção, afirma
que cada poeta tem a sua tribo, de onde ele traz as suas referências. Você de
onde vem, qual é a sua tribo?
Linaldo
Guedes – Vim de várias tribos. Comecei pela filosofia de Pessoa;
passei pelo cotidiano drummondiano, pela aspereza do sertão de Cabral, a
irreverência dos poetas marginais e a pegada rock’n’roll dos beatniks. Mas uma
tribo sempre presente em minha poética que nem eu mesmo consigo dizer de onde
saiu é a dos poemas espiritualistas e/ou referenciando religiões mesmo quando
faço poemas eróticos.
Artur
Gomes - Nos dias atuais o que é ser um poeta, militante de
poesia?
Linaldo
Guedes – Penso que escrever já é uma militância poética. Escrever,
publicar e ser lido é o ápice dessa militância. Creio que a melhor militância
do poeta esteja em seus versos.
Artur
Gomes - Que pergunta não fiz que você gostaria de responder?
Linaldo
Guedes – Nenhuma em específico. Agradeço e oportunidade de
dialogar consigo sobre poesia, minha grande paixão. Tanto que cheguei a retomar
uma relação para poder conseguir concluir um livro.
Fulinaíma
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Conheço o trabalho do Linaldo, creio, desde os anos 2000, e sempre gostei da sua pegada, às vezes erótica, às vezes, meio religiosa, mas sempre extremamente cuidadoso, com o lado formal do poema, aliás, o que cabe a todo bom poeta. Tive o prazer de receber seu livro sobre o Augusto dos Anjos e o budismo, o que me deixou muito feliz, não só por admirar o poeta Augusto dos Anjos, bem como por praticar o budismo de Nicheren Daishonin. Confesso que o li, praticamente, de um só fôlego, tal a capacidade do Linaldo de escrever de maneira fluida e inteligente, sobre tema, às vezes, árido, podendo ser compreendido por qualquer leitor, mesmo os não interessados em poesia ou budismo. Agradeço ao Linaldo pela delicadeza do gesto. E parabéns pela entrevista. Grande abraço
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