sábado, 11 de julho de 2020

Artur Gomes - EntreVistas



EntreVista concedida a minha querida amiga Eva Seiberlich, professora de letras no IFF Campus Centro. Nosso primeiro encontro pessoal, se deu na numa noite de abril de 2014, no bar e restaurante Dona Baronesa em Campos dos Goytacazes, quando em cia dos parceiros Dalton Freire e Reubes Pess, fazíamos a performance poética musical fulinaíma sax blues poesia, lembrando os 50 anos do golpe de 1964. Em 2019, em diversos momentos ela me levou ao encontro dos seus alunos no IFF para falar das minhas Juras Secretas.

Eva Seiberlich - Vejo você entrelaçado com as artes. A produção do Juras é mais "cara" intelectualmente em relação às outras artes?

Artur Gomes – Por ser uma linguagem escrita,  pode ser até que seja mais elaborada, mas de uma certa forma, ela é fruto também, das minhas performances, do teatro que produzo, que quase 100% dele é feito com poesia.  Sinto como uma linguagem  alimentando a outra, diria até antropofagicamente: a performance mata a sua fome comendo a poesia e vive versa.

Eva Seiberlich  - Os recursos linguísticos são a abertura para dizer o que queremos. É mais fácil falar/sentir metaforicamente?

Artur Gomes – A realidade é nua e crua e a sua crueldade está na faca não perfumamos para mostrá-la. Falar sentir metaforicamente não quer dizer que seja mais fácil, as vezes se torna até muito mais doloroso se expressar dessa forma. A trajetória da vida enquanto processo de  linguagem vai nos ensinando a compreender a acumulação de fracassos durante essa viagem interminável, que é a busca pela Arte. A palavra não dita, por não ter sido ainda descoberta. Essa é a busca eterna, a palavra nova, que escavada entre os dentes.

Eva Seiberlich - A partir do título, as Juras secretas são explicitamente vivências do poeta?

 Artur Gomes – Juras Secretas, não foi um nome pensado imediatamente como título para um livro. os Dos anos 90 até 2016, viajei muito, cheguei a morar periodicamente em diversas cidades, e em cada uma delas por estar praticando algum tipo de trabalho, leituras e reflexões foram sendo feitas ao longo do caminho, com referências ao universo em que me via envolvido. Os poemas foram fluindo, e aos poucos fui percebendo que ali estava presente, confissões de vida, em sua forma de viver e sentir. Foi um período, em que mergulhei de corpo e alma em Oswald de Andrade, Mário de Andrade, Guimarães Rosa e Mário Faustino, quarteto que me servia de base para os projetos que estava desenvolvendo.  

Eva Seiberlich - Como se deu o processo de captação de recursos para a feitura da obra?

Artur Gomes – Juras Secretas, foi editado pela Editora Penalux em 2018 com recursos próprios da Editora captados através da venda dos livros. Através da Penalux, será publicado em breve o meu próximo livro O Poeta Enquanto Coisa, com prefácio de Igor Fagundes e texto para orelha de Nuno Rau, grande poetas pesquisadores e estudiosos de poesia que dispensam comentários.

Eva Seiberlich  - "Falar é a sua sina". O que há de maior incômodo ainda por dizer?

Artur Gomes –Na Jura Secreta 48 defino a minha função de poeta como um devorador de sina e profanador do sacro. Os pesadelos estão aí cotidianamente a nos incomodar. Até quando? Eis a pergunta que nenhum humano conseguirá nesse momento responder precisamente. A poesia,  é fruto da nossa inquietação, do nosso incômodo, do nosso espanto, do nosso pânico, diante da vida e da morte. Mesmo quando escrevemos sobre um possível estado de felicidade, é um espanto que estamos vivendo. O “estado de poesia” é incômodo permanente. Sem ele a linguagem é frouxa a língua é flácida. Hoje mais que nunca a realidade nos leva a pensar e a refletir sobre Mário Faustino e os poemas do livro Vida Toda Linguagem e O Homem E Sua Hora.

Prefácio

Quem fez esta manhã, quem penetrou
À noite os labirintos do tesouro,
Quem fez esta manhã predestinou
Seus temas  a paráfrases do touro.
As tradições do cisne: fê-la para
Abandonar-se a mitos essenciais,
Desfolhada por ímpetos de rara
Metamorfose alada, onde jamais
Se exaure o deus que muda, que transvive.
Quem fez esta manhã fê-la por ser
Um raio a fecundá-la, não por lívida
Ausência sem pecado e fê-la ter
Em si princípio e fim: ter entre aurora
E meio-dia um homem e sua hora.

Mário Faustino
O Homem E Sua Hora – 1955

Eva Seiberlich - O que o sarcasmo(fantasioso), produzido por você de firma inquietante, deseja refletir no outro?

Artur Gomes – O sarcasmo a ironia, as inquietações, indagações, acompanham minha poesia, como forma de apontar as nossas misérias, as nossas fraquezas, as feridas nas nossas fendas, na carne e no psíquico. Eu sou o outro. Não existe outro a não seu Eu mesmo. Na Jura Secreta 44 dou o meu mergulho nessa forma existencial do ser Poeta.

Eu sou o outro
que habita dentro do meu outro Eu
não a casca da capsula
da carcaça aqui de fora

o que se vê no espelho
é só miragem
Narciso mergulhado à própria sombra

o cavalo na folhagem
esse sim é o que se vê na tela
quando a câmera rela
o concreto da outra pessoa
que não sou.

 Eva Seiberlich - Jura 26: "eu sou Drummundo". Além das referências do Carlos Drummond e o passeio entre poetas, significa o poema a fuga da existência?

Artur Gomes – o momento desse  estar no mundo, sendo um Drummundo, é um giro por várias referências, onde consigo me encontrar mais no fundo, mais profundo, e ao mesmo tempo poder brincar jogar com os 5 sentidos, mesmo que eles não tragam nenhum significado aparente, mas registra as viagens em leituras que fiz para poder me sentir esse Drummundo. Há muito de ironia nisso também, porque não é tão simples assim chegar a essas conclusões metafísicas na metáfora enquanto meta.

eu sou Drummundo
e me confundo na matéria amorosa
posso estar na fona flor da juventude
ou atitude de uma rima primorosa

e até  na pele pedra
quando me invoco baratinho
e então provoco
um barafundo cabralino

e me letra no meu verso
estando prosa
e vou pro fundo
do mais fundo
o mais profundo
mineral Guimarães Rosa

e para concluir a resposta na Jura Secreta 57 que é meta metáfora no poema meta o sentido do poema é uma oração reflexiva uma prece em “estado de poesia” diante de uma  sagrada musa outra onde também vou a fundo no mais profundo fundo desse ser Drummundo.

como alcançá-la plena
no impulso onde universo pulsa
no poema onde estico o plumo
onde o nervo da palavra cresce
onde a linha que separa a pele
é o tecido que o teu corpo veste

como alcançá-la pluma
nessa teia que aranha tece
entre um beijo outro no mamilo
onde aquilo que a pele em plumo
rompe a linda do sentido e cresce
onde o nervo da palavra sobre
o tecido do teu corpo desce
onde a teia que o alcançar descobre
no sentido que o poema é prece.

Artur Gomes
Fulinaíma MultiProjetos
(22)99815-1268 – whatsapp
EntreVistas – www.arturgumes.blogspot.com

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