Conheci Mariana Belize através de um post que ela fez para divulgar o seu
Projeto Literário Olho de Belize, o título me atraiu, pois tudo
do Olho me atrai. Fui conferir e gostei de tudo que li. Vi que além de mestranda
em Literatura escreve crítica e poesia. Então convidei-a para a EntreVistas, ela
aceitou e segue nosso bate papo.
Mariana Belize, que criou e escreve no Projeto Literário Olho de Belize, é poeta e mestranda em Literatura Brasileira pelo Programa de Letras vernáculas da UFRJ. Formada em Letras - Língua Portuguesa/ Literaturas - da UFRRJ – Nova Iguaçu Escreve resenhas críticas com base nos seus estudos de Crítica e Teoria Literária com base na Estética da Recepção e estudos sobre a relação entre arte e vida.
Artur Gomes - Como se processa o seu estado de poesia?
Mariana Belize - No cotidiano. Não acredito no transcendental, nem em alguma epifania. O meu estado de poesia se processa lentamente porque eu mesma sou lenta, tacanha e teimosa.
Artur Gomes - Seu poema preferido? Seu ou de um outro poeta de sua preferência.
Mariana Belize - XXXII – Hilda Hilst, do livro Odes mínimas
Por
que me fiz poeta?
Porque tu, morte, minha irmã,
No instante, no centro
De tudo o que vejo.
No mais que perfeito
No veio, no gozo
Colada entre eu e o outro.
No fosso
No nó de um íntimo laço
No hausto
No fogo, na minha hora fria.
Me fiz poeta
Porque à minha volta
Na humana ideia de um deus que não conheço
A ti, morte, minha irmã,
Te vejo.
Artur Gomes - Qual o seu poeta de cabeceira?
Mariana Belize - Hilda Hilst.
Artur Gomes - Em seu instante de criação existe alguma pedra de toque, algo que o impulsionar para escrever?
Mariana Belize - Busco respostas para o que não há resposta, o mistério mesmo da vida. Tento, através da palavra, processar o elaborado senso da existência sempre em movimento.
Artur Gomes - Livro que considera definitivo em sua vida¿
Mariana Belize - A obscena Senhora D., de Hilda Hilst.
Artur Gomes - Além da poesia em verso , já exercitou ou exercita outra forma de linguagem com poesia?
Mariana Belize - Sim, através de contos, algumas tentativas de iniciar um romance e um flerte com a prosa poética.
Artur Gomes - Qual poema escreveu quando teve uma pedra no meio do caminho?
Mariana Belize – todo dia ela faz tudo sempre igual:
café,
escrita, almoço, descanso
escrita,
escrita, escrita, ABNT
exercício,
jantar e dormir
todo
dia ela diz a si mesma
pra
se cuidar, essas coisas que diz
toda
mulher
diz
que está esperando alguma coisa
mas
logo levanta num ímpeto
interrompe
o próprio sonho
três
luas e dois sóis que ela teria para beijar
flutuam
esquecidos no véu carmim da noite
e
a mulher segue seu destino
sem
sombra de dúvidas
a
escrita mais uma vez
reflete-se
na tela
aos
olhos
ela
acha tudo uma merda
mas
segue plantando as rosas
podando e se cortando nos espinhos desse jardim
que é o texto escrito
nesse
papel que parece alheio
repete
a si mesma: pesquisadora
pesquisadora
investigadora
investigadora
corre
mundo e foge da própria Vida
mas
não sabe o que a espreita:
todo
dia a Vida vem e alcança seu peito
o
coração se despedaça num verso perdido
sofre,
sua, cansa, elabora
nunca
será, nevermore, Mefisto sorri:
está
errado, princesa, desça desse palco
mulher
não chega a lugar nenhum nesse mundo
quatro
lugares reservados pra ti:
cova,
prisão, manicômio, casamento
as
quatro palavras definem quem és
louca,
perdida, mal sabes
o
que queres...
ela,
no entanto, em silêncio e fúria
mantém
o movimento das teclas que bate
letra
por letra, vai catando feijão
palavra
por palavra, sem lágrimas
numa
carapaça poética
ela
se reveste
e
repete:
eu
sou a mulher do fogo
e
vigio para que sempre arda.
Amém.
Mariana Belize
Artur Gomes - Revisitando Quintana: você acha que depois dessa crise virótica pandêmica, quem passará e quem passarinho?
Mariana Belize - Quem passará? Espero que os bolsonaros-bolsonaristas-militaristas. Esse povo devotado à morte.
Os
passarinhos são todos aqueles que seguem, mesmo cansados, caminhando. O povo
que se devota à vida.
Artur Gomes – No prefácio do livro Pátria A(r)mada o poeta e jornalista Ademir Assunção, afirma que cada poeta tem a sua tribo, de onde ele trás as suas referências. Você de onde vem, qual é a sua tribo?
Mariana Belize- Eu sou uma bruxa solitária. Mas sei que sem as mulheres que me pariram, eu não seria ninguém. Minhas mães, minhas irmãs são todas as poetas, escritoras, pesquisadoras, médicas, curandeiras, donas-de-casa. São as Mulheres comprometidas consigo mesmas, com a sobrevivência das outras mulheres. Minha tribo é essa, mesmo que eu seja uma mulher desgarrada.
Artur Gomes - Nos dias atuais o que é ser um poeta, militante de poesia?
Mariana Belize - É não só escrever poesia, mas sobretudo divulgar os trabalhos dos outros poetas, escrever sobre poesia para as pessoas que não conhecem, apoiar a educação, e sobretudo não apoiar o desgoverno que vivemos.
Artur Gomes - Que pergunta não fiz que você gostaria de responder?
Mariana Belize - Se ouço música para escrever. Não ouço nada pra escrever porque sou distraída e a poesia me escapa fácil. Daí prefiro dar atenção total ao que escrevo, pra não esquecer ou me perder do fluxo.
(22)99815-1268 – whatsapp
EntreVistas
Studio Fulinaíma Produção Audiovisual
https://www.facebook.com/studiofulinaima
Realmente dá gosto de ler e seguir atenta aos olhos de Belize.
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