O ator, produtor, videomaker e agitador
cultural Artur Gomes acumula uma
bagagem de 50 anos de carreira com prêmios nacionais e internacionais em
teatro, música, literatura e artes gráficas. Gomes poderia se filiar na
tradição literária dos chamados poetas malditos, como comumente e
simplistamente nos referimos àqueles autores que constroem uma obra “rebelde”
em face do que é aceito pela sociedade, vista como meio alienante que aprisiona
os indivíduos em normas e regras. Tais autores rejeitam explicitamente regras e
cânones. Rejeição que se manifesta-se também, com a recusa em pertencer a
qualquer ideologia instituída. A desobediência, enquanto conceito moral
exemplificado no mito de Antígona é uma das características de tais
sensibilidades poéticas, que no Brasil já vem de longe com um Gregório de
Mattos e ganhou impulso e seguidores com o famoso trio da “parafernália”
rebelde: Verlaine, Baudelaire e Rimbaud.
Já
tivemos oportunidade de observar em outras obras do autor, que suas construções
poéticas seguem sempre renovadas para cima em matéria de criatividade,
elencando uma variada diversidade temática que aborda, sempre em perspectiva
ousada e radical, desde o doce e suave sentido do amor, ao cruel da relação
amorosa, flertando com o libidinoso, e questões existenciais que expressam
indignação, desobediência e transgressão. É que, explica ele: “arde em mim / um
rio / de palavras / corpo lavas erupção / mar de fogo / vulcão”. Outra faceta do autor, digna de nota, é a
criação de vários heterônimos como sejam Federico Baudelaire, EuGênio Mallarmè
ou Gigi Mocidade, talvez a mais irreverente de todos, porque fala a bandeiras
despregadas, sem papas na língua. “Muitas vezes a língua pulsa pula para o
outro lado do muro outras vezes a língua pira punk nesses tempos obscuros às
vezes a língua Dada vai rolando dados nesse jogo duro muitas vezes a língua
dark jorra luz nas trevas desse templo escuro”.
E aqui temos afinal, mais uma obra
desse múltiplo e incansável poeta que caminha com uma flor na boca, símbolo
universal de amor, de paz e beleza. A ele não importa verdadeiramente por quais
meios: “se sou torto não importa / em cada porta risco um ponto / pra revelar
os meus destroços / no alfabeto do desterro / a carnadura dos meus ossos”. É
poética que, para além de perquirir as dores e delícias da condição humana em
si, envereda pelo viés de nossa condição social sempre ultrajada. Encontramos
um poema que nos pergunta: “quem
se alimenta / dessa dor / desse horror / desse holocausto // desse
país em ruínas / da exploração dessas minas / defloração desse cabaço // quem
avaliza o des(governo / simboliza esse fracasso?” Artur Gomes segue sua árdua caminhada,
agora com o poderoso concurso da maturidade que lhe chega. Segue emprestando
sua voz aos deserdados, aos desnutridos, aos que têm sede, aos que têm fome, ou
aos que morrem assassinados nos guetos, nos campos, nas cidades por balas de
fuzil, desse país que tarda em referendar a cidadania.
Krishnamurti Góes dos Anjos - Escritor e crítico literário.
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